Automação, inteligência artificial e algoritmos. A cada salto tecnológico, a comunicação interna ganha velocidade e precisão, mas não se engane: por mais sofisticada que ela seja, alguns desafios permanecem os mesmos. Engajar equipes, capacitar lideranças e criar conexões genuínas são questões que não se resolvem com um simples clique ou uma linha de código. Em 2025, enquanto a tecnologia segue quebrando paradigmas, as empresas ainda encaram a velha e complexa missão de traduzir processos e valores em algo que faça sentido para as pessoas. Porque, no fim das contas, comunicação não é sobre ferramentas – tem a ver com gente, sobre entender e conectar. E esse sempre será o grande desafio.
Desafios esperados
Em meio às tantas inovações que prometem transformar a comunicação interna, quais são os verdadeiros desafios que insistem em ficar e quais realmente devem confrontar a área neste ano? Entre as grandes apostas está a tecnologia, com a inteligência artificial na linha de frente, carregando a promessa de personalizar, automatizar e até mesmo transformar a maneira como as empresas se comunicam com seus colaboradores. Mas será que ela é realmente capaz de lidar com a complexidade humana? Ao que tudo indica, a resposta parece ser um sonoro “não”.
Ferramentas como a IA podem, sim, otimizar processos e personalizar mensagens com base em dados, trazendo mais assertividade às decisões. Mas elas, por si só, não são suficientes. Rafael Calia, gerente de negócios da Clima Comunicação, destaca que as inovações são valiosas, mas jamais substituirão a necessidade de uma estratégia sólida e uma compreensão profunda do público interno. “Automação e IA trazem agilidade, mas sem uma estratégia alinhada ao negócio, elas não geram impacto real. Comunicação é sobre levar clareza às pessoas, mas isso só acontece quando existe um propósito bem definido”, enfatiza.
Rafael Calia, da Clima Comunicação
Essa clareza, segundo ele, não se resume a acompanhar métricas ou automatizar processos. É sobre fazer com que as pessoas entendam o que a empresa espera delas, para que os objetivos individuais se conectem às metas organizacionais. E é por isso que Rafael prefere deixar de lado as tendências do momento para falar sobre temas mais estratégicos, como cultura e marca empregadora. “Qual é o papel de comunicação em 2025 e daqui para frente? Como a comunicação deveria estar nas empresas? Acho que faz mais sentido nos questionarmos sobre isso e assim elevamos a qualidade do mercado”, reflete.
Ainda sobre tecnologia
Não à toa, é muito fácil cair na tentação de acreditar que a tecnologia, sozinha, será suficiente para revolucionar a comunicação interna em um “futuro bem próximo”. Mas, como alerta Thiago Massari, líder de comunicação integrada da Bayer Brasil, essa visão tem limites bem claros. “A IA deve ser tratada como uma ferramenta, e não como uma fonte única de conhecimento. Precisamos de profissionais que conheçam a cultura da empresa e saibam implementar iniciativas de forma estratégica e humanizada”, pontua.
A personalização, segundo ele, é uma das maiores vantagens da IA, mas só funciona quando integrada ao contexto da organização. Obviamente, as possibilidades que a tecnologia traz são bastante amplas: desde a customização de conteúdo até uma maior interatividade, geração de insights e otimização de design. Com IA, intranets podem se tornar mais fluidas e alinhadas aos hábitos de consumo dos colaboradores, por exemplo.
Comunicação interna e desafios
Contudo, quando falamos de comunicação interna, os desafios não se limitam – e nem deve se limitar – à implementação de ferramentas, por mais sofisticadas que sejam. O foco, sem dúvida, não é esse. “Nós trilhamos um longo caminho pela customização e humanização da comunicação interna e não podemos retroceder”, reforça, destacando que as ferramentas precisam servir às pessoas, e não o contrário.
Em resumo, a tecnologia jamais será capaz de substituir as conexões humanas. Pense em um canal de comunicação impecável, com design sofisticado e navegação intuitiva. Parece perfeito, certo? Mas sem interações genuínas entre as pessoas, a probabilidade de fracasso é alta. Quem faz esse alerta é Adevani Rotter, diretora-presidente da Ação Integrada. “Um texto ou um canal de comunicação impecável não engaja por si só. O que transforma e engaja é a interação humana, e isso ainda depende de líderes e profissionais que saibam criar conexões genuínas”, ressalta.
Liderança: o ponto cego da comunicação
Se as ferramentas evoluíram tanto assim, por que a comunicação interna enfrenta os mesmos desafios? A resposta pode estar em um ponto cego já conhecido: a liderança. Para Adevani, o gestor imediato é a figura central do engajamento, mas ele nem sempre está preparado para exercer esse papel. “Gastamos quase todo o nosso tempo e energia em produzir o melhor canal [de comunicação] e nos sobra pouco tempo para facilitar o relacionamento com os líderes e apoiar os gestores a serem melhores líderes comunicadores. E são eles que contratam, desenvolvem, desafiam e inspiram as equipes”, explica.
Adevani Rotter, da Ação Integrada
Por todos esses motivos, não dá para ignorar a influência que os líderes exercem sobre as equipes. Entretanto, muitos ainda veem a comunicação apenas como uma forma de alcançar resultados imediatos, sem compreender seu papel estratégico. E, como Thiago Massari bem lembra, mesmo as abordagens mais simples e diretas, quando bem aplicadas, podem gerar um impacto significativo. A boa notícia, segundo ele, é que esse gargalo pode ser superado se a comunicação for tratada como uma prioridade pela alta liderança e incorporada à cultura organizacional.
Equipes multigeracionais
Tudo isso ganha ainda mais relevância em ambientes multigeracionais, onde diferentes visões e valores se cruzam diariamente. Thiago Massari traz um exemplo interessante: o programa de mentoria reversa realizado na Bayer, no qual ele é mentoreado por uma profissional mais jovem. Esse exercício, segundo ele, amplia a capacidade de enxergar o mundo sob outras perspectivas. “A comunicação deve ser, acima de tudo, diálogo, relacionamento, construção e cocriação. As pessoas precisam confiar que têm voz, espaço para se expressar e que suas contribuições são valorizadas no processo de tomada de decisões”, pontua.
Embora criar conexões autênticas entre gerações seja um dos desafios mais atuais da comunicação interna, Thiago reforça que não há fórmulas mágicas para superá-lo. O segredo está em ouvir constantemente, com empatia e abertura. Quando feito com intenção, esse movimento enriquece as interações e torna possível que diferentes gerações não apenas coexistam, mas aprendam e cresçam juntas.
O fator diversidade
Mas trabalhar em um ambiente multigeracional exige muito mais do que boa vontade. Rafael Calia, gerente de negócios da Clima Comunicação, é categórico ao afirmar que diversidade geracional, por si só, não garante inovação. Para ele, equipes formadas por diferentes gerações podem agregar um enorme valor às empresas, mas o fator “diversidade” precisa ser tratado de forma estratégica para alcançar resultados reais. “Juntar pessoas de diferentes gerações não é suficiente. É preciso entender o que cada uma delas tem de melhor, criar dinâmicas que promovam trocas genuínas e cocriar a partir dessas diferenças”, ressalta. A reflexão aqui é clara: o que a Geração Z oferece que o Millennial não entrega? E o que o Millennial traz que a Geração Z não consegue? Identificar essas qualidades pode ser o ponto de virada para qualquer organização.
Rafael também destaca a necessidade de repensar práticas repetitivas e pouco impactantes, como campanhas padronizadas e a tradicional entrega de brindes. “Vamos parar de falar de meses coloridos e repetir sempre as mesmas dinâmicas. Não é isso que cria conexão. Precisamos de planejamento, um entendimento profundo do público e criatividade para que as ações sejam realmente relevantes”, argumenta. Nesse cenário, ele considera o papel da comunicação interna fundamental por conectar os objetivos das organizações às práticas cotidianas – e de forma criativa. “Criar conexão, gerar engajamento e senso de pertencimento também são responsabilidades da comunicação interna”, conclui.
Romantização
Aqui cabe uma reflexão importante: capacitar lideranças e gerenciar equipes multigeracionais são apenas a ponta do iceberg quando falamos dos desafios que a comunicação interna enfrenta atualmente. Mais do que isso, é urgente mudar o mindset da área, que ainda é vista como algo secundário em muitas organizações. Rafael Calia faz um alerta importante: “A comunicação precisa parar de ser romântica. É tudo muito bonito – as campanhas são divertidas e tudo mais –, mas coisas assim não entregam resultado”. Para ele, a comunicação interna pode, sim, ser atraente, desde que esteja alinhada com os objetivos da empresa e contribua de forma concreta para os resultados.
Se existe um ponto cego a ser esclarecido, é exatamente a falta de conexão estratégica, o que nos leva a outro desafio crítico: a necessidade de maior clareza quanto às métricas que realmente importam. Não estamos falando de taxas de abertura de e-mails ou curtidas em postagens internas, mas de indicadores que mostram como a comunicação impacta na cultura, no engajamento e nos resultados do negócio. “A comunicação não é um ‘bracinho’ da empresa; ela precisa ser robusta, até porque as empresas que investem em comunicação também estão investindo em cultura”, reforça Rafael.
Essa mudança de visão não é apenas necessária, mas urgente. Como bem aponta Thiago Massari, da Bayer Brasil, a comunicação interna já deixou de ser, há muito tempo, apenas um conjunto de canais, newsletters e campanhas. “Ela é, na verdade, consultoria, modelagem cultural, estratégia e um pilar do negócio”, afirma. A pandemia deixou isso mais claro do que nunca, ao mostrar que as empresas que investem de forma estratégica em comunicação interna conseguem navegar melhor pelas crises. Mas, segundo ele, em um movimento natural de inércia, muitas organizações já voltaram aos antigos modelos, o que não é nada positivo. “É urgente repensar essa abordagem para 2025, garantindo que a comunicação interna seja vista como um agente estratégico contínuo”, reforça.
Foto: imagem gerada por IA – DALL·E
Engajamento: o verdadeiro termômetro
Se a comunicação interna precisa ser cada vez mais estratégica, engajar os colaboradores nesse diálogo é, sem dúvidas, um dos seus maiores e mais importantes desafios. Afinal, em um cenário onde mensagens e notificações disputam a atenção de todos, capturar e manter o interesse dos colaboradores se tornou uma tarefa realmente complexa. Para Thiago, a chave está em compreender o contexto e ser assertivo na entrega de conteúdo. “A pressão para acessar a próxima novidade é constante, com estímulos vindos de todos os lados. Nesse cenário, a curadoria interna de conteúdo precisa ser cada vez mais estratégica e assertiva”, aponta.
Uma saída para aproximar as mensagens do público interno é trazer elementos já consolidados nas redes sociais, como memes e gifs, que garantem autenticidade e criam identificação. Além disso, programas de influenciadores internos também ajudam a tornar esse diálogo mais humano. Por lá, o Baynfluencers, lançado em 2022, tem feito bastante sucesso. “Apostamos neles para humanizar a comunicação e fortalecer as conexões. Essa abordagem traz mais autenticidade e engajamento para dentro da organização”, explica.
Quem é seu público?
Mas engajar vai além de implementar formatos inovadores. Trata-se de entender os colaboradores em profundidade. Como reforça Rafael Calia, gerente de negócios da Clima Comunicação, o engajamento começa com um conhecimento detalhado do público interno, “Você precisa descer à operação, entender o que é relevante para eles, como consomem conteúdo e o que querem receber. Engajamento não vem de volume de informação, mas de relevância”, afirma.
Ele cita o exemplo da Lego, que transformou seu negócio ao perceber que seu público-alvo não era mais apenas crianças, mas também adultos. “Quanto mais você entende o comportamento do público, mais você se destaca. E isso vale para comunicação interna: o diferencial está no detalhe, na personalização”, conclui.
Foto: imagem gerada por IA – DALL·E
Presencial e digital
E quando o engajamento precisa acontecer em um cenário híbrido, o desafio se torna ainda mais interessante. Então, como garantir conexões genuínas em um ambiente onde as interações transitam entre o presencial e o digital? Para Adevani Rotter, diretora-presidente da Ação Integrada, a resposta depende, mais uma vez, da atuação do líder imediato. “A comunicação interna com suas ferramentas e iniciativas não consegue engajar sozinha os times da organização. Tudo é engajamento. E para isso não há receita perfeita para um bolo perfeito”, reflete.
Adevani reforça a relevância desse papel ao citar um estudo da consultoria europeia IT People, que mapeou 285 pontos de contato na experiência do colaborador – sendo 36 considerados críticos e, desses, 35 diretamente ligados ao gestor. Isso deixa claro que o sucesso do engajamento passa, inevitavelmente, pelas mãos das lideranças. Em um mundo híbrido, a essência do engajamento continua sendo a mesma: criar conexões genuínas, personalizar as ações e oferecer experiências que realmente façam sentido para as pessoas – onde quer que estejam.
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15/02/2025
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