*Por Eduardo Pires
A construção civil é, ao mesmo tempo, uma das atividades mais fundamentais para o desenvolvimento das cidades e uma das que mais impactam o meio ambiente. Só que, apesar do aumento da pressão por práticas sustentáveis, o setor ainda enfrenta desafios para consolidar os primeiros passos. Em vez de evoluirmos em processos rumo a um setor mais sustentável, muitas empresas seguem travadas em desafios estruturais que dificultam uma evolução concreta.
Hoje, a realidade de boa parte das incorporadoras é pautada por processos manuais, muitas vezes baseados em planilhas que não acompanham a complexidade da operação. A coleta de dados é feita de forma pouco automatizada, demandando tempo, custo elevado e sem garantir o nível de precisão necessário. É impossível obter granularidade por obra, o que compromete a qualidade do inventário e inviabiliza análises consistentes por empreendimento, justamente o nível de detalhe necessário para decisões práticas e estratégicas. O resultado disso é previsível: relatórios que não capturam a completa realidade das emissões e acabam servindo, algumas vezes, como obrigação formal.
Mesmo quando se recorre a consultorias, os problemas podem não ser totalmente resolvidos. O escopo da coleta de dados varia conforme o olhar de quem está conduzindo o projeto, tornando os relatórios com escopos variáveis, o que dificulta comparações setoriais. Não há uma metodologia única, uma base comum, um padrão setorial para servir de referência. E enquanto isso, as incorporadoras, sobretudo as pequenas e médias, ainda têm dificuldades em medir de forma estruturada o ponto de partida na jornada ESG.
Há ainda outro ponto crítico: os custos. Hoje, o esforço necessário para atender às exigências de ESG pode ser elevado, tanto em recursos humanos quanto financeiros. As ferramentas disponíveis, como as calculadoras de emissões, exigem um nível de detalhamento que as empresas por vezes não têm porque os dados não são registrados, não estão estruturados ou disponíveis de forma padronizada em seus sistemas. E construir esse banco de dados do zero é um investimento pesado para ser feito de forma isolada.
No campo técnico, a situação traz desafios adicionais. Há carência de bases setoriais consolidadas sobre fatores de emissão, assim como de metodologias harmonizadas e critérios padronizados para coleta e análise. Isso reforça a importância de iniciativas coletivas que tragam consistência e comparabilidade aos dados.
Esse cenário cria uma barreira natural à escala e à democratização da pauta ESG. A sustentabilidade hoje acaba se tornando mais acessível às grandes corporações, mas precisa ser cada vez mais democratizada como um compromisso de todo o setor. É fundamental que o ESG seja tratado como prioridade estratégica, e não apenas como um projeto complementar na construção civil. O tema é urgente, complexo, e precisa ser tratado com a seriedade que exige.
A boa notícia? A tecnologia existe. E é justamente ela que pode destravar esse processo, permitindo automatização, padronização, inteligência e escala. Mas para que ela cumpra esse papel, o setor precisa reconhecer que os meios atuais precisam evoluir. Só assim será possível virar o jogo — e, enfim, avançar para uma construção civil verdadeiramente comprometida com o futuro.
Eduardo Pires é diretor de produtos para Construção da TOTVS







