Um colapso na confiança

Desconfiança é o estado natural da sociedade

Se por um lado as grandes transformações que vivemos no modelo de trabalho, no consumo, na saúde e nas relações interpessoais fizeram aumentar nossa resiliência como seres humanos, por outro também abalou a confiança nas instituições e lideranças mundo afora, sobretudo pela forma com a qual lidaram com a gestão das crises mais recentes, uma sanitária e outra humanitária.

A edição deste ano do Edelman Trust Barometer 2022 – estudo global que mede a confiança e a credibilidade nas empresas, governos e lideranças sociais – corrobora essa afirmação. A pesquisa é bem ampla, mas destaco aqui 10 pontos que merecem a nossa atenção redobrada:

Desconfiança é o estado natural da sociedade: seis em cada dez pessoas disseram que sua tendência padrão é não confiar em algo até que haja alguma evidência de sua veracidade. Para 64% dos entrevistados, chegamos a um ponto onde as pessoas são incapazes de ter debates construtivos e civilizados sobre temas dos quais discordam. Quando a desconfiança impera, perdemos a capacidade de argumentar e colaborar.

Empresas são novamente as mais confiáveis: as empresas são as entidades mais confiáveis para 61% das pessoas, à frente de ONGs, governos e imprensa. No entanto, 77% dos respondentes confiam na empresa em que trabalham, tornando o relacionamento entre empregado e empregador extremamente importante. No Brasil essa confiança é ainda maior, de 79%.

Governo e mídia em um ciclo de desconfiança: quase um em cada dois cidadãos consultados enxergam o governo e a mídia como forças divisórias na sociedade. Além disso, líderes governamentais e jornalistas são vistos como as lideranças menos confiáveis atualmente. Menos da metade dos respondentes afirma confiar neles.

Novos modelos falham ao tentar resolver o tema da confiança: nenhuma das principais fontes de informação e notícias são tidas como confiáveis. A confiança em plataformas de busca ficou em primeiro lugar com 59%, seguido pela mídia tradicional (57%), mídia de canais próprios das marcas (43%) e, por último, as redes sociais, com apenas 37%.

Preocupação com as fake news nunca foi tão alta: a propagação de informações e notícias falsas e seu uso como um arsenal de guerra preocupa 76% dos respondentes em esfera global. No Brasil, 81% das pessoas que participaram do estudo têm essa preocupação.

Existe um colapso de confiança nas democracias: em muitas das democracias estudadas, as instituições inspiram confiança em menos da metade de suas populações, como é o caso da Alemanha (46 pontos), Argentina (45 pontos) e Estados Unidos (43 pontos). Além disso, a maioria dos cidadãos de todos os países desenvolvidos contemplados no estudo não crê que eles e suas famílias estarão melhores daqui a cinco anos.

Medos da sociedade vêm à tona: sem a fé que as instituições irão prover as soluções ou líderes sociais que precisamos, os medos da sociedade tornam-se mais agudos, sendo que 85% estão preocupados com a perda de seus empregos, e 75% estão apreensivos sobre as crises climáticas.

Empresas precisam se posicionar sobre questões sociais: enquanto empresas superam governos em 53 pontos no quesito competência e em 26 pontos nas questões éticas, os participantes da pesquisa acreditam que as companhias não estão fazendo o bastante para endereçar os problemas da sociedade, em temas como crises climáticas (52%), desigualdade econômica (49%), requalificação dos profissionais (46%) e confiança nas informações (42%).

Liderança social passa a ser uma função crucial nos negócios: 60% dos funcionários querem que seu CEO fale sobre temas controversos que os afligem e 80% da população geral quer que os CEOs se engajem em discussões sobre políticas públicas com atores externos ou do trabalho que a empresa realiza em benefício da sociedade. Espera-se que os CEOs estejam engajados em discussões sobre política laboral e economia (76%), desigualdade salarial (73%), tecnologia e automação (74%), aquecimento global e crises climáticas (68%), preconceito e discriminação (65%).

Empresas devem liderar para quebrar o ciclo da desconfiança: sob todos os aspectos, com uma margem muito grande, as pessoas querem maior engajamento das empresas. Por exemplo, sobre o tema crises climáticas, 52% afirmaram que as organizações não estão fazendo o bastante, contra apenas 9% que disseram o contrário. A função e a expectativa das empresas nunca foram tão claras, e as organizações devem reconhecer que este papel social veio para ficar.

Em meio a uma grave crise de confiança, demonstrada pelo estudo, é fundamental que as lideranças empresariais e governamentais assumam o protagonismo e atuem de forma proativa e colaborativa com suas equipes nas pautas prioritárias para a sociedade. Reconhecer que esta agenda não é a mesma de 10 anos atrás e que é preciso uma mudança de comportamento e de atitude é o primeiro passo rumo a uma jornada de reconstrução da confiança.

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