Seja relevante e conheça seu público interno: o que o varejo brasileiro tem feito para engajar seus colaboradores?

Diversificação, personalização e storytelling são algumas das estratégias da comunicação interna para conquistar a audiência

Por trás das prateleiras, balcões e vitrines, existe uma complexa rede de comunicação no varejo que precisa funcionar com exatidão para garantir o sucesso das operações e, ao mesmo tempo, conectar seus milhares de colaboradores. O desafio fica ainda maior quando nos damos conta da dimensão do varejo nacional, que em 2022 movimentou mais de R$ 2,4 trilhões, o equivalente a 27,7% do PIB brasileiro (dados da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo – SBVC).

Patricia Vasconcelos Giacomo, da RD
Patricia Vasconcelos Giacomo, da RD

Nesse cenário de alta competitividade e cifras trilionárias, o que impressiona mesmo é compreender que há pessoas dedicadas a fazer essa cadeia produtiva girar – do atendimento ao cliente ao almoxarifado, passando pelo backoffice e lideranças. E a comunicação no varejo é justamente o motor dessa engrenagem que tem como particularidades o dinamismo, a segmentação das operações e o alto turnover (rotatividade de funcionários). O obstáculo a ser superado tem a ver com isso: garantir que a informação flua de forma clara, rápida e precisa entre os diversos níveis hierárquicos, departamentos e unidades das varejistas.

Patrícia Vasconcelos Giacomo, diretora da Gente e Cultura da RD – grupo formado pelas farmácias Droga Raia e Drogasil –, explica que o desafio está atrelado ao próprio funcionamento do varejo, que é mais acelerado. “Ele é muito dinâmico, por isso nosso timing e dinamismo são as maiores peculiaridades. Temos também o desafio de comunicar para diferentes públicos, afinal somos mais de 50 mil funcionários divididos em três unidades de negócios. Priorizamos agilidade, clareza e qualidade em nossas comunicações”, pontua.

A comunicação no varejo exige diversificação 

A solução para a pulverização do varejo, aponta Patrícia, é o sortimento dos canais de comunicação para atender todos os tipos de público e suas especificidades. Um exemplo disso é a recente instalação de uma rádio nos centros de distribuição que, além de transmitir músicas selecionadas pelos funcionários, divulga spots da liderança e de comunicação interna.

Catalina Ortiz Maya
Catalina Ortiz Maya

No Grupo Pão de Açúcar (GPA), que integra as marcas Extra e Pão de Açúcar, a diversificação também faz parte do cotidiano de seus 38 mil colaboradores, até como um reflexo de como a comunicação acontece no dia a dia. Há pessoas que gostam de se informar ouvindo rádio, outras que preferem ler jornal ou acessar notícias pela internet, por exemplo. Desse modo, é natural que os canais de comunicação no varejo sejam criados e adaptados para a realidade de cada grupo de colaboradores. Para Catalina Ortiz Maya, gerente de Comunicação Corporativa do GPA, é fundamental entender que existem esses diferentes públicos e cada qual com uma realidade e forma de se comunicar. “Por isso, no varejo, precisamos impactar cada um deles com diferentes canais e de uma forma que todos recebam as mensagens. Precisamos ser rápidos e efetivos, porque uma notícia importante para o colaborador no horário da manhã já ficou velha à noite.”

Regina Durante da Lojas Renner S.A
Regina Durante da Lojas Renner S.A

Outro exemplo de “personalização” acontece no ecossistema da Lojas Renner S.A, que conta com 650 lojas espalhadas pelo Brasil das marcas Camicado, Youcom, Ashua e Renner. Por lá, a comunicação com as unidades de negócio leva em conta suas especificidades e segmentações de públicos, como administrativo, operacional, líder e não líder. A diretora de Gente e Sustentabilidade do grupo, Regina Durante, revela que a comunicação interna está constantemente estudando e atualizando as práticas de storytelling para compartilhar informações relevantes. “Assim, falamos a linguagem do nosso público interno, que é jovem (60% dele está na faixa de 20 a 34 anos). Hoje, a maior parte da nossa comunicação é feita por meio de vídeos ou imagens atrativas e de fácil compreensão.”

Diversidade e atratividade no setor varejista

Mariana Augusto da Arcos Dorados

A capilarização da informação é um fator que move o setor varejista. Mas essas ferramentas de comunicação interna, além de serem práticas e engajadoras, também devem levar em conta a diversidade de pessoas que compõem os grupos. Numa empresa como a Arcos Dorados, franquia que opera a marca McDonald’s na América Latina e Caribe, com mais de mil restaurantes e 60 mil funcionários só no Brasil, a diversidade precisa estar refletida na comunicação. E, naturalmente, existe a preocupação em adequar o que é falado ao público jovem que está na linha de frente do negócio. É o que explica a gerente sênior de Comunicação Corporativa da Divisão Brasil da Arcos Dorados, Mariana Augusto. “É preciso ser estratégico para identificar os melhores canais, linguagem e momentos de contato com os funcionários.

No caso da Arcos Dorados, trata-se da operação de restaurantes McDonald’s, onde o público é jovem e ativo nas redes sociais. Tendo isso em mente, nossa comunicação precisa ser direta e atraente, para que possa ser eficiente em espaços como as salas de descanso e plataformas que eles podem acessar pelo celular”, reflete. E para a comunicação fluir por toda a cadeia produtiva, ela também precisa ser interativa, segundo Mariana. Além de facilitar o acesso, é importante fornecer canais de comunicação que permitam aos colaboradores expressar suas opiniões, sugerir melhorias e ter trocas positivas com as lideranças da companhia. “Todos esses aspectos, juntos, fazem da comunicação um elemento estratégico para a construção e manutenção da cultura da empresa e para a gestão de pessoas”, explica.

Proximidade pelo celular

Proximidade pelo celular e no presencial
Foto: Reprodução/Freepik

A diversificação da comunicação também vem acompanhada de diversidade e muita tecnologia. Na RD, a rede social corporativa tem grande destaque na logística da empresa por alcançar 100% dos funcionários, já que pode ser acessada a qualquer momento pelo celular. “Ela funciona como uma via de mão dupla. Ao mesmo tempo que comunicamos, recebemos feedback em tempo real das nossas pessoas.” É uma ferramenta, nas palavras da porta-voz da RD, que fomenta o engajamento e permite a colaboração entre as equipes.

A diretora de Gente e Sustentabilidade da Lojas Renner S.A., Regina Durante, também concorda com a relevância dos canais digitais no setor varejista, tendo em vista que proporcionam instantaneidade e gestão do conhecimento para a empresa. Entretanto, como ela bem diz, nada substitui o papel da liderança comunicadora na relação com o colaborador. “Consideramos nossa rede social uma ferramenta bastante eficaz, mas ainda assim elencamos como forma prioritária de comunicação a liderança bem-informada e instrumentalizada para exercer seu papel de líder comunicador. Temos a crença no papel do líder como guardião da nossa cultura, inspirando o seu time em torno do nosso propósito”, revela Regina. A comunicação, nesse sentido, torna-se fundamental para que a figura do líder possa exercer essa função dentro do grupo.

A Arcos Dorados, por exemplo, coloca em prática essa máxima ao promover encontros presenciais com a alta liderança da companhia em diferentes regiões do Brasil, por meio da iniciativa “Pod Falar”. São momentos valiosos de troca de informações e experiências. Mas a tecnologia também dá sua contribuição promovendo momentos de conexão, mesmo que remotamente, como explica a gerente sênior de Comunicação Corporativa, Mariana Augusto. “Contamos com o apoio de plataformas de transmissão para realizar apresentações de resultados e webinars de forma online, possibilitando um alcance muito maior.”

Varejo: Vivian Machado do Dia Brasil
Vivian Machado do Dia Brasil

A realidade é igualmente desafiadora para a rede Dia Brasil. Com mais de 6 mil colaboradores espalhados por lojas, escritórios e centros de distribuição no país, a empresa entende que a comunicação interna precisa chegar a todos com agilidade, o que faz do canal digital seu maior meio de relacionamento com o funcionário. A plataforma ConectaDia é um bom exemplo disso, funcionando quase como uma rede social interna para os colaboradores, além de ser a principal ferramenta de treinamento e especialização. Porém, segundo a gerente de Cultura, Engajamento e Comunicação do Dia Brasil, Vivian Machado, é preciso buscar o meio mais assertivo para cada público ou tema a ser tratado. “Atualmente nosso maior canal de comunicação é digital, mas constantemente fazemos testes de campanhas com colaboradores como protagonistas, algumas ativações presenciais, reforço da comunicação via liderança e assim vamos ajustando a comunicação”, explica.

Contudo, independentemente do canal escolhido, as mensagens compartilhadas precisam ser simples, claras e alinhadas à cultura da empresa, para que possam ser comunicadas tanto para a alta liderança quanto para os colaboradores de loja. Catalina Ortiz, do GPA, lembra que a efetividade da comunicação muito tem a ver com a simplicidade de como é transmitida a informação. “Essa clareza é necessária para que a mensagem transite por toda companhia independente de cargo, setor ou função”, conclui.

Engajamento é bom para os negócios

Antes de olhar a experiência do cliente, é preciso olhar para a do funcionário. É o que diz a diretora de Gente e Cultura da RD – RaiaDrogasil, Patrícia Vasconcelos Giacomo, que relaciona uma vivência positiva com a qualidade da informação que será transmitida na linha de frente. “Para cuidarmos de gente, entendemos ser necessário desenvolver times saudáveis, inclusivos e de alta performance, capazes de cuidar da própria saúde e da saúde dos clientes. Buscamos inspirar, desenvolver e valorizar as pessoas para atingirem seu máximo potencial dentro de um ambiente seguro e com diversidade, que promova respeito e confiança”, resume.

Os esforços em ampliar o alcance da informação em um setor tão diversificado e pulverizado como o varejo não só promovem um ambiente corporativo positivo aos olhos dos colaboradores como também melhoram a conexão da marca com o cliente. Segundo Regina Durante, da Lojas Renner S.A, colaboradores bem-informados e engajados possuem maior propriedade sobre o negócio, as ferramentas e os processos que precisam administrar em sua rotina de trabalho, fatores que colaboram com a geração de resultados. “Nenhuma empresa existe sem seus colaboradores e eles são fundamentais para bons resultados”, complementa Vivian Machado, da rede Dia Brasil. A matemática é simples: ao cuidar de seus colaboradores, eles cuidarão bem dos clientes. “Uma ótima experiência do cliente começa com colaboradores engajados e bem-informados sobre a empresa, seu modelo de atendimento e seus valores e produtos”, reflete a gerente.

Comunicação no varejo é um desafio diário
A comunicação no varejo é um desafio diário. Foto: Reprodução/Freepik

No varejo brasileiro, a missão diária é fazer com que informações relevantes cheguem ao colaborador com a agilidade necessária para que ele tenha a resposta certa quando o cliente requisitar. Catalina Ortiz, gerente de Comunicação Corporativa GPA, acredita que, até pela proximidade com o consumidor, a comunicação interna tem efeito direto na experiência do cliente. “Quando o colaborador está munido de informações e alinhado às mensagens da companhia, isso cria uma relação de confiança com o cliente e melhora a experiência de compra, e o impacto disso no desempenho nas vendas é direto”, conta.

Ao conectar o funcionário ao propósito da empresa, a comunicação interna no varejo ajuda a promover o orgulho de pertencer a algo que o engaja. “Qualquer impacto de aspectos internos de uma companhia na experiência do cliente precisa começar com a valorização dos funcionários, e a comunicação interna faz parte dessa fórmula”, crava a gerente sênior de Comunicação Corporativa da Arcos Dorados, Mariana Augusto.

O papel da comunicação no varejo: como engajar?

A comunicação no varejo precisa ser dinâmica
Foto: Reprodução/Freepik

Conhecido por sua alta rotatividade e dinamismo, o setor varejista é marcado por ondas sazonais de contratações temporárias e mudanças frequentes nas demandas dos consumidores. São promoções, estratégias de venda e interações sendo moldadas e atualizadas continuamente, numa dinâmica que pode comprometer o engajamento dos funcionários por falta de identificação com a empresa. Além disso, o dinamismo das operações também impacta na troca de informações, que acontece de forma mais intensa. Uma pesquisa recente da startup Comunica.In, plataforma de gestão e automação de processos de comunicação para o público interno, mostra que o varejo ainda precisa aperfeiçoar suas estratégias para conquistar sua audiência. Apesar do envio constante de comunicados (que é muito comum no setor varejista), a taxa de visualização entre os funcionários é inferior à dos demais: 35,5% contra a média geral de 42%. O relatório, produzido a partir de informações coletadas da própria plataforma, analisou nove milhões de envios em um universo de 61 mil colaboradores durante o segundo semestre de 2022. Diante disso, como contornar a falta de engajamento? Patrícia Vasconcelos, diretora da Gente e Cultura da RD, cita o primeiro passo: aumentar a relevância dos temas, até por conta da rotina do setor. “Nós, como área especialista, temos o dever de receber a demanda e entender o impacto dessa informação para o negócio”, pontua.

A etapa seguinte é “estudar e conhecer seu público interno”, indica Mariana Augusto, da Arcos Dorados. Segundo ela, aumentar o engajamento é definitivamente um dos maiores desafios da comunicação interna no varejo, justamente por conta da rotina do setor. “A comunicação interna disputa a atenção com outros fatores tão importantes quanto, como atendimento aos clientes, gestão das unidades etc. Por isso, é importante identificar a melhor estratégia para motivar o consumo dos conteúdos da comunicação no dia a dia.”

para superar a rotatividade e dinamismo, a comunicação no varejo precisa ser diversificada
Para superar a rotatividade e o dinamismo, a comunicação no varejo precisa ser diversificada. Foto: Reprodução/Freepik

Já para a diretora de Gente e Sustentabilidade da Lojas Renner S.A., Regina Durante, a terceira estratégia para driblar o alto turnover e a dinâmica intensa do segmento é apostar em uma comunicação interna no varejo mais educativa e engajadora. “E com conteúdo relevante que possa ser consumido de forma assíncrona e no timing que o colaborador considera ideal”, complementa.

Apesar do baixo engajamento, a gerente de Cultura, Engajamento e Comunicação do Dia Brasil, Vivian Machado, não acredita que exista uma resistência por parte do colaborador no varejo, e sim o desafio de alcançar quem está na ponta e não trabalha com computador ou celular, por exemplo. “A baixa adesão é o desafio, e o papel do profissional de comunicação interna é criar ferramentas, modelos e caminhos mais efetivos para alcançar seu público interno”, finaliza.


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