-Na era digital, há espaço de sobra para quem tem o que dizer. As redes sociais estão aí para provar que a comunicação pertence a todos, inclusive às marcas. Mas aqui o objetivo não é simplesmente persuadir o público com publicidade convencional ou por meio de brand content. Em uma sociedade onde a fome por informação é insaciável, produzir conteúdo relevante não só faz parte do negócio, como tem tudo a ver com o propósito de cada uma delas.
Unindo a fome com a vontade de comer, empresas com forte reputação no mercado estão cada vez mais empenhadas em falar diretamente com sua audiência, assumindo o papel de brand publishers. Ao pé da letra, o conceito significa “publicação de marca”, mas ele representa muito mais do que isso. Em vez de transmitir informação apenas por meio da mídia tradicional, as marcas líderes em seus segmentos têm estruturado plataformas próprias, incorporando estratégias editoriais à comunicação com o público.
Comunicando com propósito
No âmbito da saúde, por exemplo, uma empresa que tem como missão “cuidar de gente” possui autoridade suficiente para compartilhar informações pertinentes à sociedade. Comunicar, nesse contexto, tem o poder de impactar as pessoas e conscientizá-las sobre temas sensíveis ligados à saúde pública, desde a prevenção de doenças até a promoção de hábitos saudáveis. Além disso, ao se posicionar como publisher, ela também pode abrir espaço para pautas que dificilmente teriam lugar na mídia convencional. Como bem destaca Paulo Henrique Ferreira, diretor-executivo da Barões Digital Publishing e autor do livro Brand Publishing e Transição Midiática, trata-se de um compromisso fundamental com a sociedade, tendo em vista o impacto das marcas em nossas vidas.
Nesse cenário, é através do brand publishing que as organizações têm a oportunidade de exercer sua responsabilidade social e, ao mesmo tempo, reforçar seu papel como fontes confiáveis de informações. PH, que tem na bagagem, entre outras coisas, sete anos de LANCE! como gestor de mídias digitais, é incisivo ao pontuar a profunda ligação entre comunicação e propósito de marca. “A sociedade demanda das marcas uma comunicação editorial em nível profissional. Ela quer e precisa ser informada. Por isso, digo que é uma questão de responsabilidade midiática, ainda mais no setor da saúde”, reflete. Para o jornalista, se a comunicação editorial não está sendo levada a sério, é sinal de que as marcas não estão cumprindo com seu propósito.
Comunicação que salva vidas
Manter uma comunicação íntegra e relevante com a sociedade é um compromisso que multinacionais como a AstraZeneca e Pfizer, os destaques da Pesquisa Empresas que Melhor se Comunicam com Jornalistas, têm assumido com muita responsabilidade. Fabrício Costa, gerente sênior de comunicação e ESG da AstraZeneca Brasil, resume bem o que representa a comunicação editorial no ramo da saúde: é levar informação confiável, com base científica e de maneira transparente, para quem precisa. “Acreditamos que, se por meio da comunicação, conseguirmos impactar a sociedade e mobilizá-la para a prevenção, estamos cumprindo a nossa missão”, afirma.
Nas palavras de Cristiane Santos, diretora de Assuntos Corporativos e Comunicação da Pfizer no país, o compartilhamento de informações seguras sobre saúde não apenas empodera o público, mas também impulsiona a implementação de políticas decisivas na área, sendo capaz de salvar vidas. “Ao planejar nossas iniciativas, estamos atentos aos grandes desafios sanitários: sejam as enfermidades de elevada taxa de mortalidade ou aquelas que representam necessidades não atendidas também do ponto de vista da comunicação, com escassez de informações”, explica a executiva.
Responsabilidade social
Além de compartilhar conteúdos variados em suas redes sociais, as farmacêuticas também mantêm portais de notícias próprios, nos quais divulgam suas principais ações na área da saúde. A AstraZeneca, por exemplo, disponibiliza ao público uma plataforma exclusiva com foco em saúde e bem-estar. A missão desta iniciativa, segundo Fabrício Costa, é proporcionar suporte de qualidade, principalmente a pacientes e cuidadores. Com 14 anos de história, o programa FazBem já beneficiou mais de três milhões de pessoas, sendo um verdadeiro aliado ao longo da jornada do paciente. “Tudo para que a caminhada seja mais tranquila e com mais qualidade de vida”, completa Fabrício.
No site da Pfizer, por sua vez, os visitantes têm acesso a informações abrangentes sobre diversos temas, como doenças raras, tabagismo, envelhecimento, oncologia, transplantes e vacinação. Como bem aponta Cristiane Santos, mais do que buscar soluções para os grandes desafios do mundo, o objetivo é enfrentar a desinformação. E nada mais potente do que dialogar com médicos, jornalistas, associações e a própria sociedade para que suas iniciativas tenham um impacto genuíno.
Um exemplo disso é a parceria realizada pela Pfizer com o jornalista Chico Felitti como forma de dialogar sobre a polineuropatia amiloidótica familiar (PAF), uma doença rara e hereditária que afeta o sistema nervoso periférico. O resultado desse colab foi o podcast “A Silenciosa”, elogiado por Cristiane por reunir os elementos essenciais de uma boa história: uma narrativa envolvente, mistério a ser desvendado, experiências reais e um olhar sensível. Segundo ela, em sua estreia, em junho de 2023, o podcast foi um dos mais ouvidos no Brasil. “O nosso objetivo é levar informação de qualidade para a sociedade e fomentar o protagonismo e o acolhimento para quem já enfrenta a doença.”
No brand publishing, confiança se constrói
O ponto levantado por Paulo Henrique, da Barões Digital, com relação à reputação das marcas é reflexo do que os brasileiros enxergam ao comparar, por exemplo, a credibilidade delas com a confiança no governo. De acordo com a pesquisa Trust Barometer de 2023, realizada pela Edelman com 32 mil pessoas, em 28 países, empresas e ONGs são as únicas instituições consideradas “competentes e éticas” pela população. No Brasil, enquanto 40% dos entrevistados atestaram confiar na governança, 64% destacaram acreditar nas informações compartilhadas pelas organizações. Além disso, o levantamento mostrou que a maioria dos participantes (76%) valoriza as marcas que contribuem com a sociedade ao abordar temas relevantes – e o ESG está aí para provar.
Não à toa, o fundador da Barões ressalta que a crescente demanda por informação vem acompanhada pela necessidade das empresas se posicionarem, seja sobre o que acontece internamente ou quanto aos desafios globais. O ativo editorial delas, além de muito bem-vindo, é uma demanda a ser cumprida com profissionalismo, destaca PH. “Na sociedade da informação, as marcas entram como veículos especializados, como think tanks, organizações pensantes que trabalham com a técnica jornalística e origem de conteúdo declarada, respeitando a inteligência do povo. A mensagem é clara e acessível.” Cristiane Santos, diretora da Pfizer Brasil, complementa a reflexão, enfatizando que objetividade, clareza e autenticidade são elementos essenciais para conectar e engajar pessoas. Na sua visão, mensagens verdadeiras provocam identificação e levam o público à ação. E ressalta: “Eu costumo dizer que há grandes oportunidades de comunicação escondidas dentro de todas as histórias. Basta saber contá-las”.
Mas essa tarefa não é nada fácil. O desafio reside em transmitir mensagens complexas a audiências diversas. E é aqui que a técnica jornalística, dentro do contexto de brand publishing, se destaca. Acrescente à fórmula objetividade, didática e sensibilidade e você terá um conteúdo que faz a diferença na vida das pessoas. É o que aponta Ricardo Castellani, gerente sênior de Comunicação da Novo Nordisk, farmacêutica multinacional, cuja jornada está intimamente ligada ao combate de doenças crônicas graves, como a obesidade. “Entendemos que informação de qualidade é parte inerente de qualquer tratamento”, crava. E ao longo desse processo, a transparência é um ponto-chave.
Consciência e credibilidade
Na Novo Nordisk, isso se desdobra em diferentes canais e plataformas, como blog, site e canais proprietários (incluindo redes sociais e Spotify), por meio de um plano estratégico de comunicação que amarra todas as pontas: de colaboradores a jornalistas, passando por todos os stakeholders. Para se ter ideia, só no Instagram, que segundo Castellani “funciona como um canal de alerta”, há mais de 40 mil seguidores interessados nos conteúdos educativos compartilhados pela empresa. Já em seu blog, localizado dentro do site da Novo Nordisk, são publicados artigos e notícias relevantes sobre doenças crônicas, suas causas e tratamentos, com o objetivo de “trazer luz” para a jornada do paciente. “O blog faz parte dessa ampla estratégia de comunicação, que reflete a preocupação da empresa em estar sempre próxima da população e da imprensa”, reflete o gerente sênior de Comunicação.
Entretanto, para que essa engrenagem funcione diariamente, a farmacêutica conta com um time robusto de comunicação, formado por jornalistas e relações públicas, que é responsável por garantir a apuração das informações com o rigor e a precisão que somente o jornalismo pode oferecer. Além disso, todo o seu conteúdo – tanto externo quanto interno – é produzido em parceria com a área médica. Ele explica: “temos profissionais de saúde que estão antenados aos mais recentes estudos científicos e que possuem conhecimento técnico para comentar com propriedade e clareza”. Nas palavras de Castellani, é dessa forma que se transmite credibilidade ao público, por mais desafiador que seja o combate às fake news.
A AstraZeneca é outro exemplo de como o jornalismo especializado confere valor à narrativa. Na empresa, todo o time de comunicação é formado por profissionais especializados em saúde, o que garante um diálogo eficaz com a sociedade. Fabrício Costa, gerente sênior de comunicação e ESG da companhia, esclarece a estratégia: “Refinamos as mensagens de acordo com o público, adotando uma abordagem mais técnica para médicos e profissionais da saúde, e mais didática para a população”. Para ele, uma comunicação eficaz, seja a realizada pela imprensa tradicional ou compartilhada pelas empresas – que, segundo ele, operam de forma complementar -, é essencial para criar consciência e ampliar o alcance das mensagens. “Toda informação deve ter respaldo científico. Se tratando de doenças, é extremamente importante evidenciar formas de prevenção e diagnóstico precoce. Além disso, os termos técnicos precisam ser explicados e exemplificados para melhor compreensão da mensagem”.
Comunicação editorial
Com o brand publishing em alta, fica evidente que o jornalismo com “J” maiúsculo, como técnica de informação, não pertence mais “a meia dúzia de famílias”, como era no século 20. “Ele é maior”, conclui Paulo Henrique, da Barões Digital, salientando que, quando as empresas não têm medo de consumidores bem-informados, a comunicação editorial ajuda a reforçar a reputação, demonstrando propósito e responsabilidade. Os exemplos anteriores reforçam essa ideia.
Em um cenário onde as posições dos “players” precisam ser claras, a origem do conteúdo também é muito importante. “Se uma marca tem uma visão e essa visão é construtiva, ela pode transformá-la em comunicação editorial de maneira legítima”, afirma o jornalista, acrescentando que, para um brand publishing de sucesso, nenhum detalhe pode ser ocultado do público. Desse modo, seja no papel de curadora ou de produtora de conteúdo, a marca deve agir com transparência, sem esconder uma vírgula sequer da sua audiência. A credibilidade se constrói assim.
Combate à desinformação
Você já parou para pensar como a comunicação editorial, inclusive dentro do conceito de brand publishing, foi importante para enfrentar a maior crise sanitária do século? Sem dúvida, a pandemia representou um divisor de águas no âmbito da comunicação em saúde. Cristiane Santos, da Pfizer, destaca que a busca por informação confiável se tornou o centro da narrativa, impulsionando o interesse até por plataformas científicas.
De lá para cá, a pauta de saúde se fortaleceu ainda mais, como evidenciado pela pesquisa realizada pela farmacêutica em parceria com o Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria). O resultado é animador: mais de um a cada três entrevistados indicou que começou a acompanhar mais as notícias sobre saúde a partir da pandemia. “São pessoas que passaram a buscar fontes confiáveis para se informar melhor sobre o assunto. Eu vejo um horizonte cheio de perspectivas e oportunidades de valorização da ciência”, celebra.
Contudo, à medida que as pautas de saúde ganharam importância entre a população, a disseminação de informações falsas também se intensificou. E hoje, no pós-pandemia, as fake news desencadearam uma forte onda de desconhecimento sobre variados assuntos, incluindo a vacinação. Para a representante da Pfizer, essa epidemia de desinformação é um problema que envolve todo o ecossistema de saúde e precisa ser enfrentada pelos diferentes players que fazem parte dele. “Acreditamos na importância das parcerias e de uma ação conjunta e coordenada para potencializar as mensagens sobre a importância da proteção contra os diferentes tipos de doenças.”
O bom jornalismo na comunicação de marcas: desafios e oportunidades no brand publishing
Com a interação cada vez mais intensa entre jornalistas e grandes marcas, o mercado da comunicação se expande, abrindo novos horizontes para os profissionais da área
Milhares de pessoas que antes não faziam parte do fluxo de consumo de notícias agora estão conectadas às informações que circulam pelas plataformas digitais. É impossível tirar os olhos do celular: dormimos com ele e despertamos ao som de seu alarme. Não é por acaso que o fazer jornalístico esteja passando por transformações profundas.
Em um cenário marcado por múltiplas vozes, a disputa pela atenção do público é ininterrupta. Agora, com as marcas igualmente empenhadas em se fazer ouvir, o espaço que antes pertencia apenas à publicidade está sendo ocupado por jornalistas. E o brand publisher está aí para provar que a comunicação editorial das marcas precisa da expertise jornalística para gerar conteúdo de valor. E isso ninguém pode negar. No entanto, diante dessa interação cada vez mais estreita entre jornalistas e marcas com o brand publishing, surge a pergunta: essa convergência é realmente positiva para o jornalismo?
Mercado em expansão com o brand publishing
Paulo Henrique Ferreira, jornalista e diretor-executivo da Barões Digital Publishing, acredita que, com a crescente demanda por informação, a comunicação editorial (via brand publishing) ganhará uma escala nunca vista. E o resultado disso será um mercado consideravelmente maior e mais produtivo para o jornalismo. “O jornalista precisa abrir a mente e assumir seu papel de publisher. Conteúdo é rei, mas a distribuição é a rainha. Hoje, é essencial compreender os elementos de distribuição da informação. O meio e a mensagem.”
Do lado das marcas, já não basta reverberar suas mensagens apenas por meio da publicidade. Além de persuadir seu público, elas também querem informá-lo. E como fazer essa separação de maneira positiva? Na visão de PH, o jornalista é um excelente profissional para esse tipo de papel: possui rigor e ética para uma apuração de qualidade. “Mas ele precisa estar aberto a isso. As empresas contam justamente com os jornalistas para cuidar desse conteúdo, como se fosse um veículo de comunicação”, completa.
Cláudia Collucci, repórter especializada em saúde da Folha de S. Paulo, também acredita que os jornalistas estão cada vez mais produzindo conteúdo, seja de forma independente ou em colaboração com as empresas.
Além de se tornar mais uma alternativa de trabalho, a comunicação editorial assinada por jornalistas especializados confere credibilidade ao que é comunicado pelas marcas, já que a informação é tratada com o rigor característico da profissão. “Conteúdo produzido por jornalista tende a ser bem-feito e mais engajado. Afinal, o papel dele é checar qualquer informação que ele receba e que julgue relevante, independentemente de onde venha essa informação”, complementa Cláudia, que também foi um dos destaques do Prêmio Especialistas, iniciativa promovida pelo CECOM e pela Plataforma Negócios da Comunicação.
Saúde com propósito
A área da saúde exemplifica muito bem como o brand publisher pode ampliar o alcance da informação na sociedade, ao mesmo tempo em que abre novas oportunidades para o jornalismo especializado. Para Diogo Sponchiato, redator-chefe da Veja Saúde, essa convergência aquece e alimenta a pauta de saúde junto ao público, transformando as marcas em “canais complementares ao jornalismo tradicional”. Ele observa que, atualmente, tanto empresas quanto farmácias, hospitais e centros de pesquisa também se tornaram protagonistas na criação de conteúdo.
Entretanto, a produção desse “conteúdo de qualidade” vai além da inserção de fontes confiáveis no texto. Não à toa, Sponchiato destaca a necessidade de as marcas não se limitarem à simples fundamentação científica, garantindo autenticidade às mensagens transmitidas ao público. “O trabalho de conscientização precisa ser genuíno para que não seja confundido como um mero lobby para, em última instância, vender medicamentos”, pondera o jornalista, que também foi um dos destaques do Prêmio Especialistas.
Pluralidade na comunicação
Esse movimento das marcas se assumindo como publishers não é uma tendência só no Brasil. Segundo a jornalista Natalia Cuminale, diretora de conteúdo e CEO da Futuro da Saúde, hub de jornalismo especializado em saúde, isso foi fundamental durante a pandemia e será ainda mais frequente daqui em diante. “Teremos cada vez mais produtores de conteúdo comprometidos com a informação científica.”
Em um cenário marcado pela desinformação, ter marcas de peso fazendo coro sobre temas ligados à saúde e trazendo especialistas para disseminar informações de forma clara e objetiva representa o antídoto mais eficaz. “É um trabalho complementar. Tudo o que for em prol da informação e das questões de saúde pública só reforça a mensagem”, conclui a jornalista e destaque do Prêmio Especialistas.