Uma comunicação interna afiada, antenada ao que acontece dentro e fora das empresas, é fundamental para gerenciar e superar crises, melhorar o relacionamento entre os colaboradores e engajá-los em torno dos valores propagados pelas organizações, permitindo um maior envolvimento com o ambiente de trabalho. A falta de diálogo nesse delicado ecossistema pode minar o resultado das equipes – pela simples falta de comunicação – e comprometer, por consequência, o posicionamento da empresa no mercado.
Quando uma crise como a enfrentada pela Americanas vem à tona, por exemplo, com um rombo bilionário nas contas bancárias e mais de 44 mil funcionários à espera de respostas, as percepções de futuro dentro da organização passam a ser entremeadas por incertezas das mais variadas. É nessa hora que a comunicação interna “horizontalizada”, de mão dupla, tem papel-chave para desemaranhar todas as desconfianças que possam surgir, como queda de faturamento, demissões em massa e fechamento de lojas. “Essa horizontalização da comunicação achata distâncias hierárquicas e geográficas, tornando a comunicação mais humanizada e acolhedora”, opina Bruno Borges Sciammarella, gerente de Canais de Comunicação Interna da Petrobras, companhia que foi um dos destaques no Prêmio Empresas que Melhor se Comunicam com Colaboradores como a “Marca Destaque do Ano”, além de ter vencido nas categorias “Employee Experience” e “Grandes Ideias”
Tecnologia a favor da comunicação interna
Foi o que aconteceu também durante a pandemia de Covid-19, em um contexto inédito de distanciamento social e trabalho remoto, onde a transparência, a tecnologia e, sobretudo, a agilidade da comunicação entre lideranças e colaboradores fizeram toda a diferença para manter todas as engrenagens funcionando em sincronia. A estratégia adotada internamente em grande parte das empresas foi estabelecer novos canais de comunicação para dar sustentação ao fluxo de informações – só que agora virtualmente.
Segundo Bruno, os canais digitais se tornaram prioritários, inclusive depois da pandemia, até por conta das mudanças incorporadas no modelo de trabalho, que migrou do presencial para o híbrido. Rede social corporativa, WhatsApp, Microsoft Teams, YouTube, streaming, aplicativos de celular, entre outros meios, são alguns exemplos dessas inovações que foram integradas ao ambiente de trabalho. “Ferramentas como Microsoft Teams concentram hoje a maior parcela das horas trabalhadas dos nossos empregados. Além das mídias tradicionais, como intranet e murais eletrônicos, nos últimos três anos ganharam espaço as redes sociais internas, como o Workplace, e também tivemos que incorporar o WhatsApp como canal de comunicação interna”, complementa. Já na Via, que opera as marcas Casas Bahia, Ponto e Extra.com, a rede corporativa é composta por canais digitais que vão além do e-mail, como streaming de vídeos e Microsoft Teams. Hélio Muniz, diretor de Comunicações & ESG (sigla para sustentabilidade ambiental, social e governança corporativa) na Via e diretor-presidente da Fundação Casas Bahia, destaca que todos esses canais e plataformas de gestão de pessoas são de mão dupla e estão prontos para ouvir o colaborador.
O papel da liderança
Porém, por mais eficientes que sejam essas ferramentas, não há melhor meio de comunicação que um líder comunicador – e isso não vale somente para momentos de crise. “O papel da liderança é fundamental, pois é um forte guardião da credibilidade e um grande transmissor dos valores e da cultura da corporação”, ressalta Muniz. A conduta de um líder, transparente e assertiva, pode servir de modelo para a sua equipe, estimular o diálogo e o alinhamento de diferentes setores, propagar mensagens-chaves e ainda conter rumores. E tudo isso, obviamente, ganha ainda mais valor num contexto de crise, no qual a transparência é essencial para reforçar a relação de confiança entre a empresa e seus colaboradores. Para Bruno Borges, a atuação da liderança nesses momentos mais críticos também traz confiança, transparência e demonstra o quanto o assunto em pauta é relevante para a companhia, o que, segundo ele, pode ser “o diferencial entre manter ou afundar a sua reputação”. O Banco do Brasil, empresa que conquistou recentemente o Prêmio Empresas que Melhor se Comunicam com Colaboradores nas categorias “Digital” e “KPIs de Efetividade”, é outra instituição que também acredita na alta capacidade de mobilização e influência das lideranças. Seu protagonismo, assinala a companhia, é fundamental para o sucesso da comunicação e engajamento dos funcionários e de todos os públicos de relacionamento. “Os líderes exercem papel central na disseminação de mensagens-chave e do posicionamento da empresa”, finaliza o BB.
Integração entre RH e comunicação
E para que tudo isso seja possível, a comunicação interna e a gestão de recursos humanos, que têm como foco os funcionários, também devem caminhar na mesma direção. Essa proximidade, para Hélio, é o que dá agilidade às mensagens e faz com que as ações sejam planejadas em conjunto. Sem isso, a informação não chegaria a todos com a efetividade necessária. Em organizações como as já citadas, que envolvem milhares de colaboradores, essa parceria precisa ser incorporada ao modelo de gestão comunicacional. É o que aponta o Banco do Brasil. “O principal desafio da comunicação em uma empresa com mais de 85 mil funcionários é que as informações cheguem para todos. E para cumprir esse objetivo, a atuação conjunta entre comunicação e gestão de pessoas é extremamente relevante. A premissa é que a comunicação consiga potencializar as iniciativas do banco para o público interno, disseminando boas práticas e comportamentos desejáveis. Buscamos estar onde o nosso público está”, disse a instituição por meio de sua assessoria de imprensa. Essa aproximação, portanto, é essencial para qualquer empresa, pois, segundo Bruno Borges, da Petrobras, “assuntos ligados a recursos humanos são os que geram mais engajamento em qualquer conteúdo veiculado pela comunicação interna”.
Diálogo aberto
Durante a pandemia de Covid-19, em 2020, a liderança comunicadora da LATAM Airlines foi fundamental para o enfrentamento dessa crise, tida como a maior do século, e que impactou significativamente o setor aéreo – com aeroportos vazios e aviões no chão. Além de informar sobre o que estava acontecendo com transparência, também era preciso cuidar e engajar os funcionários, tendo em vista os impactos negativos causados pela pandemia.
A empresa então apostou no protagonismo de seu CEO Jerome Cadier para enfrentar esse desafio, que por iniciativa própria passou a gravar pequenos vídeos pelo celular sobre as principais demandas da LATAM, estabelecendo um diálogo aberto com seus colaboradores. Caio Ferracina, coordenador sênior de Comunicação Interna e Endomarketing da companhia, explica que a liderança foi, de fato, a comunicação da companhia naquele momento. “Costumo dizer em palestras e conversas com colegas que muitas companhias aprenderam ‘na dor’ o valor da comunicação para seus empregados, na pandemia, pois não tinham uma cultura de comunicação estabelecida e consolidada. Já outras aprenderam ‘no amor’ e puderam dedicar seus esforços em cuidar, informar, orientar e engajar seu público interno, pois já existiam canais, campanhas, apoio da liderança e credibilidade aprovados e reconhecidos. E esse foi o nosso caso, no Amor”, reflete.
No ano seguinte, a estratégia foi aperfeiçoada com o lançamento do Canal do CEO, uma plataforma composta por três canais digitais onde o time da LATAM poderia interagir e se informar. A iniciativa, inclusive, foi a vencedora da categoria “Gestão de Crise” no Prêmio Empresas que Melhor se Comunicam com Colaboradores. E desse aprendizado surgiram ainda outros projetos, como o “Minuto LATAM”, com vídeos pontuais e em formato de plantão; o LATAM News com Jerome, um programa ao vivo de perguntas e respostas; e o Webcast, talk show com convidados e reportagens. Outro canal que surgiu dessa experiência foi o Líderes em Dia, um boletim semanal global para a disseminação de informações entre as lideranças da companhia.
Para o coordenador de comunicação interna da LATAM, o trabalho de agir com transparência e senso de urgência proporcionou avanços significativos que reverberam até hoje. “Os números falam por si. Avançamos a passos largos na mensuração de comunicação interna na LATAM. Números de interações (envio de perguntas), média de visualizações e total de views do YouTube; sem falar do nível de repertório e sofisticação que as perguntas foram ganhando. Sinto que toda a companhia está evoluindo como comunicação, desde quem pergunta, passando por quem responde e chegando em quem assiste”, conclui.