Sustentabilidade e moda podem andar juntas, afirma Lilian Pacce

Jornalista e influenciadora na área de moda fala da importância da conscientização ambiental, de forma ampla

É quase impossível falar do jornalismo de moda sem citar o nome de Lilian Pacce. A jornalista com mais de 30 anos de carreira tornou-se referência em seu segmento. Eleita melhor jornalista de moda pelo Prêmio Especialistas, promovido pelo Cecom – Centros de Estudos da Comunicação e Plataforma Negócios da Comunicação, desde 2016, e reconhecida na lista das 500 principais profissionais de mundo da Business of Fashion, em 2014.

A jornalista tem passagem pelos jornais Folha de S. Paulo, Jornal do Brasil, e O Estado de S. Paulo, colaborou também com as revistas Vogue, Harper ‘s Bazaar, Elle, Daslu e Ícaro e canais MTV e GNT, este último chancelou a versatilidade de Pacce nas entrevistas que iam de Thereza Collor a Gisele Bundchen, e desde 2008 é publisher do site Lilian Pacce, um dos pioneiros em tratar de moda, arte e cultura. 

No mesmo ano, criou o canal no Youtube, que leva seu nome e tem mais de 15 milhões de visualizações. Porém, a carreira de Lilian vai muito além do jornalismo, atualmente, estuda na University of Arts London, cursando curadoria de arte. Desde 2019 ela é curadora adjunta de moda do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand  – MASP e membro do conselho internacional do Bikini Art Museum, na Alemanha. 

Autora de três livros, um deles relacionando moda e meio ambiente, tem se mostrado preocupada com o meio ambiente e afirma que os dois mundos podem andar lado a lado. Ela é pioneira na campanha contra as sacolas plásticas descartáveis, tendo feito a curadoria da exposição do lançamento da campanha paulista “Eu não sou de plástico”, em 2007. Recentemente lançou as campanhas #1LookPorUmaSemana e #CamudinhoNão. É embaixadora do Together Band, iniciativa da Bottletoppers, que colabora com os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

Nesta entrevista exclusiva à Negócios da Comunicação, Lilian compartilha perspectivas sobre o mundo dos creators, moda,  jornalismo e meio ambiente — causa que ela defende há muito tempo. 

Confira a entrevista:

Com Taís Araújo

Lilian, como uma estudante de psicologia foi parar no mundo do jornalismo?

Eu fiz as duas faculdades por um tempo e, quando comecei a fazer free-lancer, adorei e fui diminuindo os créditos na psicologia até que no terceiro ano eu não voltei, achei que iria terminar, mas nunca voltei. O jornalismo tem a função de fazer denúncias sociais e procurar uma outra lente nos fatos que muitas vezes não é a lente oficial e que o establishment quer passar

Foi uma boa escolha

Foi muito importante para mim atuar tentando ter o foco em mostrar coisas boas para o mundo e tentar fazer mais justiça. infelizmente nestas décadas nada mudou, talvez só tenha piorado. Eu pensei que poderia deixar um mundo melhor para meus filhos, meus netos e não estou deixando.

A moda e a sustentabilidade podem caminhar juntas?

Estamos vendo uma transformação na moda, novas políticas e parâmetros para essas marcas seguirem a política de sustentabilidade que é fundamental porque temos que olhar para o mundo como nosso quintal, não como o quintal do vizinho. É um mundo só. Essa ideia de explorar os recursos até que eles acabem, na verdade, traz um problema para nós. É engraçado como não é percebido por grandes empresas, nós temos que preservar e isso é sustentabilidade.

E o que mudou?

Nos últimas décadas vimos uma ideia de progresso, que eu acho que é equivocada que é baseada unicamente no crescimento e isso não é possível. Tem uma tendência do decrescimento. Temos que pensar nisso, ter um tamanho que é sustentável para o negócio, para o meio ambiente, porque nem sempre esse crescimento vai ser saudável. O fast fashion está em declínio, tanto que o que vemos muito, hoje é o second hands, o mercado de revenda. Isso é uma boa notícia, eu acho. Existem previsões de que o mercado de revenda vai superar o fast fashion até o próximo ano. Tem tanta roupa no mundo que o lixo têxtil está presente em várias partes do mundo. Precisaríamos fazer a economia circular com peças de roupas porque isso permite uma peça única.

Seu site foi um dos primeiros a tratar da moda sustentável, inclusive em vídeos

Nós fomos o primeiro site a ter uma seção voltada para a sustentabilidade, quando lancei o site em 2008, muitos players do mercado ficaram chocados por eu falar de sustentabilidade na moda e na beleza porque isso era uma utopia e impossível. Estamos vendo aí que é fundamental hoje a sustentabilidade para o mundo. O genocídio dos Yanomamis, a ganância do extrativismo de madeira e garimpo a todo custo, onde as vidas não valem nada. Só enxergam o lucro hoje, não existe uma visão de médio e longo prazo, porque vai acabar a floresta, o rio, já estão matando pessoas que dependem da terra para viver. Não é difícil entender que este extrativismo é maléfico e negativo.

Você foi uma das primeiras pessoas que estavam na TV e foi para o YouTube, sendo pioneira neste segmento. Como surgiu a ideia

Quando lancei o site entrei também no YouTube. Entretanto, fiz um acordo com o MSN e na época existia uma plataforma de vídeo que tinha que ser exclusiva. Então, tivemos que parar nossa presença no YouTube e focar apenas no MSN. Ao longo do tempo meu contrato mudou e quando pude voltar para o YouTube resolvi fazer uma coisa mais solta do que eu fazia na GNT. Não era uma questão de views e likes, eu quis fazer algo que achei que estava faltando para as pessoas, ou o que eu acho que eu posso contribuir de verdade. Eu até hoje não senti vontade de fazer dancinha no TikTok. Posso fazer porque acho engraçado, mas, acho que posso contribuir de outra forma. O 70 coisas, por exemplo, me dá muito trabalho, mas me dá também muito prazer.

Durante a gravação do GNT Fashion, na primavera grega

Como é o processo de criação dos vídeos?

Eu faço pesquisa profunda, sou meio testemunha da história, consulto muitas fontes e conto a partir do meu ponto de vista; acho que é por isso que as pessoas gostam, porque eu estou contando uma história, às vezes até meio aleatória. É algo que eu adoro fazer. Para mim é muito trabalhoso, mas me dá muito prazer. Na hora de gravar eu faço um roteiro, até mesmo para ajudar o editor, eu improviso em cima do roteiro. O que leva mais tempo é o pré-gravar, a pesquisa, e o pós, a edição.

E no blog? Quando pessoas te ajudam?

 No blog, temos uma pessoa, fazemos uma reunião de pauta. Decidimos o que vai rolar, e aí, claro, acontecem coisas que o planejamento tem que ser furado. Mas, sempre fazemos o planejamento semanal e reunião de pauta. Até o começo do ano as publicações eram religiosamente todos os dias, mas estou em um momento em que estou repensando o que eu quero. Por que como estou em Londres e o curso de mestrado é muito intenso, exige muito de mim, eu preciso pesar as coisas para ver como as coisas ficam.

Hoje vemos nas mídias a grande presença e influência dos creators. O que eles fazem, pode ser comparado ao trabalho de jornalistas?

É o sinal dos tempos. Os influenciadores estão em uma mídia que é a que acessamos mais, o mundo inteiro está ligado nas redes sociais. São pessoas que dominam as plataformas e que entregam exatamente o que as marcas querem, a propagando, essa versão sempre elogiosa, sempre tudo maravilhoso. São raros os creators, em moda, que são mais críticos; geralmente é um show off permanente. Tem influenciador faz uma cobertura jornalística. Mas a maioria não é jornalista e não tem cobertura jornalística. Pode ser jornalista influenciador, mas em geral, o influenciador não tem o olhar jornalístico e não tem nem o compromisso jornalístico, inclusive.

Com Nicolas Ghesquière, da Louis Vuitton

Jornalistas especializados, podem se tornar influenciadores em seus assuntos? Tendo seu público que os acompanham nas mídias tradicionais?

Eu acho que é um caminho sim. Eu acho muito bacana, se existe uma mídia e ela está à disposição por que não vamos usar? Quando estamos vendo os grandes veículos e a mídia tradicional tão fragilizados, em geral, com esses outros canais abertos e de fácil acesso, isso é muito bom.

Como começou seu gosto pela arte?

Quando comecei a trabalhar na Folha eu cobria artes plásticas, é engraçado isso, era final dos anos 1980 e era muito forte as galerias de arte em São Paulo, estava havendo uma expansão do setor, só depois virei uma especialista em moda. Eu sempre gostei de arte, é um assunto que me interessa profundamente. Quando eu fiz a exposição sobre o biquíni, associei moda e arte. Depois fui convidada pelo MASP para fazer a curadoria da segunda fase do projeto MASP Moda, que junta estilistas e artistas, foi uma honra participar. A exposição deve acontecer entre este ano e o próximo.

 

 

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