No segundo dia do 2° Fórum Melhor RH Diversidade e Inclusão, promovido pelas Plataformas Melhor RH e Negócios da Comunicação, a inclusão racial e de gênero deu a tônica de diversos painéis. Também ficou clara a necessidade e o valor de se colocar em prática projetos amplos e bem embasados de inclusão e diversidade, com ajuda externa, se necessário.
O primeiro painel do dia destacou a diferença, na prática, de posicionamento para a empresa que assina compromissos públicos para ser mais diversa e inclusiva. Medida mostra-se muito além do marketing: demonstra seriedade sobre as metas além de influenciar as lideranças para que não se desviem dos objetivos.
Um dos speakers desse painel, Fabio Lacerda, VP de Gente e Cultura da Cogna Educação, contou sobre as metas da companhia e quais os principais compromissos estabelecidos. Há grupos de afinidade e envolvimento de todos os setores na causa e o objetivo de ⅓ de mulheres negras e público LGBTQIAP+ no conselho administrativo. Há, ainda, a missão de evoluir de 47% para 50% de mulheres nos quadros de liderança (o efetivo feminino entre aproximadamente 24 mil funcionários, independentemente dos cargos, já é de mais de 50%). Tudo isso deve se concretizar até 2025.
Para Simone Beier, diretora de RH da Cargill, nesse cenário, “deve ficar muito claro aquilo que a empresa não tolera mais”, ressalta. O momento em que são selados esses compromissos, segundo a executiva, “é quando todos olham para a empresa para ver se aquilo é de verdade”, destaca.
O verdadeiro papel dos grupos de afinidade foi tema do segundo painel, na presença de Barbara Toledo, diretora de Consumo e Varejo e Líder Comitê de D&I da Intel; Carla Costa, gerente de Desenvolvimento Organizacional da Boehringer Ingelheim; e Salim Khouri, gerente Global de Pessoas e Líder do Grupo de Afinidade LGBTQIA+ da Vale.
Segundo Khouri, a primeira pergunta a ser feita num projeto de diversidade e inclusão é qual o valor agregado da iniciativa, pois isso irá orientar as discussões nos grupos de afinidade, os processos de recrutamento e seleção, entre outros que fazem parte da implantação e desenvolvimento do projeto. “Qual o business case? Por que fazer esse investimento?”, indaga o executivo, lembrando benefícios gerais para as companhias: 60% dos candidatos a uma vaga buscam empresas mais diversas, há aumento real no EBITDA, a cada 10% mais mulheres no quadro de colaboradores, entre outros.
Barbara conta que a discussão sobre o tema não é algo novo na Intel, e acredita que “diversidade é questão de sobrevivência” na área de tecnologia. “Não dá para suprir o negócio apenas com homens”, comenta, sobre a deficiência de mão de obra do setor e a pouca inserção feminina no segmento. E destaca: “soluções são feitas por pessoas”, entendendo esse como o ponto central de qualquer iniciativa na área de inclusão. “Equipes diversas atingem um mercado maior.”
“Diversidade é questão de sobrevivência na área de tecnologia; Não dá para suprir o negócio apenas com homens”
O tema das mulheres setor de tecnologia ganhou corpo no painel seguinte, integrado por Angélica Consiglio, CEO da Planin Comunicação; Sandra Maura, CEO da TopMind, e Beatriz Carvalho, analista de Recursos Humanos Master da Vale. O preconceito enraizado ainda afasta muitas mulheres do segmento, por acreditarem que não são capazes e as poucas que estão na área são assoladas pela síndrome da impostora, lembra Angélica.
Beatriz, por sua vez, crê que há avanços, mas recorda que falta de acesso à formação de tecnologia por mulheres é histórica. “Há desconhecimento que faz com que esses cursos, ainda hoje, sejam para uma maioria masculina”, destaca.
Sandra conta que o tratamento da inserção das mulheres na carreira de tecnologia com naturalidade favoreceu a inclusão em sua empresa. O suporte técnico, com sua necessidade de gente hábil em comunicação, acabou sendo porta de entrada de muitas colaboradoras, que hoje estão em todos os setores, incluindo o de desenvolvimento. “Aqui as mulheres têm voz”, revela a executiva.
“É muito importante não só atrair, mas manter essa mulher na companhia”, ensina, por fim, Beatriz. Na Vale, esse acolhimento definitivo, ela conta, passa por treinamentos em todas as áreas, envolvendo inclusive os gestores, sobre vieses inconscientes, que podem de maneira velada, minar a inserção e o desenvolvimento do público afirmativo nas empresas.
Fit cultural e auxílio
O painel em seguida tratou de focar nas consequências de se recrutar pessoas que se encaixem na cultura da companhia. A prática, que vem a ser uma das maneiras atuais mais recorrentes de perpetuar a exclusão dentro das organizações, foi tema de debate entre Juliana Aquino, head Projetos de RH da Enel; Paola Klee, diretora executiva de pessoas do G17- Grupo Todos Empreendimentos, e Pedro Ivo Campos, supervisor KAM da Infojobs.
Campos lembra o fato de a cultura corporativa estar enraizada em padrões que nem sempre precisam ser o único caminho para a empresa, e que nem sempre combinam com diversidade, chamando as demais participantes do painel à reflexão sobre alternativas a esse cenário.
Paola responde que sua experiência anterior, atuando em RH e consultoria, vinha sendo o trabalho com fit cultural e expectativas das empresas nesse sentido, mas que atualmente já se fala muito mais em add cultural, ou seja: trabalhar com a percepção daquilo que o novo talento pode agregar à cultura da companhia.
Juliana conta que, na Enel, toda governança de diversidade passou por um processo de escuta dos colaboradores, para gerar pertencimento e conexão, dentro de um movimento que se assemelha muito mais a agregar valor com as contribuições do que simplesmente buscar um fit cultural. “Formamos diversos grupos focais, envolvendo mais de 500 pessoas, para que a gente pudesse entender as necessidades dos mais diferentes grupos nos mais diferentes temas”, relata a executiva.
Quando esse movimento interno, voluntário ou não, é algo que traz dificuldade à companhia, é possível contratar uma consultoria e a hora certa de pedir a ajuda externa foi tema do painel seguinte. Participaram desse momento Beatriz Semeghini, gerente de Cultura, Comunicação Interna e ESG da Alelo Brasil; Carolina Prado, head de Comunicação da Intel e líder Comitê de D&I da Intel, e Maurício Pestana, CEO da Revista Raça e autor do livro “A empresa antirracista”.
Na Intel, uma empresa com presença global, uma consultoria foi chamada para auxiliar na demanda de lidar com questões culturais específicas da inclusão no Brasil, como conta Carolina. A executiva destaca que o tema da inclusão e da diversidade é uma jornada sob constante avaliação da companhia.
Já na Alelo, a diversidade é um valor, estimulando inovações e com vistas à transformação social. “O que se aprende no ambiente de trabalho se reflete na sociedade”, entende Beatriz. Na evolução da jornada de inclusão da empresa, a contratação de uma consultoria ocorreu um passo atrás da criação de área específica para o tema. Até então o assunto era tratado por voluntários e em períodos que se encaixavam entre outras demandas desses colaboradores. Sendo assim, o trabalho da consultoria foi aprofundar-se de forma dirigida e em tempo integral sobre os dados da companhia, para que esta pudesse priorizar as ações corretas.
Pestana afirma que o ponto de partida é entender que o problema da falta de diversidade é da sociedade, e isso se refletirá de alguma maneira na empresa. Após essa constatação, há que se fazer um diagnóstico para que a consultoria possa se debruçar sobre os dados da companhia e auxiliar na construção das soluções. O executivo lembra da pressão que existe do mercado por metas na área e que a consultoria pode auxiliar em planos factíveis para o seu cumprimento.
Diferentes marcadores sociais e representatividade
Mecanismos de recrutamento são um dos principais aliados das equipes de RH que desejam criar ambientes diversos e inclusivos. Principalmente se a estratégia adotada for a da criação de vagas afirmativas, direcionadas a perfis específicos em busca não somente de equalizar oportunidades dentro da empresa, mas também de contribuir para a redução de desajustes sociais. O painel seguinte do dia contou com Helen Jessica Correa, HR Brazil Talent Acquisition Coordinator da Syngenta; Edna Rocha, diretora de Recursos Humanos da Sonepar, e Esteban Blanco Ziegler, diretor de Recursos Humanos da Boehringer Ingelheim, para discutir o tema.
Ziegler entende que ações afirmativas são meio e não fim, são importante mecanismo de avanço da Boehringer Ingelheim no tema da diversidade e inclusão. “Trabalhamos muito forte com nossos colaboradores e colaboradoras para tratar o tema com protagonismo. Estratégia é co-construída com aqueles que querem fazer parte dos grupos de afinidade”, relata Ziegler, para quem este trabalho é caminho de transformação social.
“Empoderar as diferenças é a única forma de encontrar o todo e ter sucesso”, entende Edna. A executiva relata ações da Sonepar em prol da equidade de gênero e em apoio a jovens carentes, oferecendo qualificação e oportunidades de trabalho a esse público, além do trabalho junto ao público com deficiência.
Helen, por sua vez, lembra que abraçar a realidade, em âmbito global ou local, é muito importante. Sobretudo a brasileira que é de diversidade. Estratégia adotada é ter diferentes grupos de afinidade envolvendo entes de diferentes departamentos, auxiliando no recrutamento e na sustentabilidade da inclusão do público contratado com foco em representatividade.
“Ações afirmativas são meio e não fim, são importante mecanismo de avanço no tema da diversidade e inclusão”
No penúltimo painel do dia, foi abordado o impacto da licença parental inclusiva, fruto de um olhar acolhedor das organizações aos diferentes formatos de família existentes, na presença de Flavia Lisboa Porto, diretora de Recursos Humanos da Yara Brasil; Neila Mara Lopes, head de Diversidade & Inclusão da Sanofi, e Tiago Koch Monteiro, idealizador do projeto Homem Paterno.
Monteiro relembra a trajetória da legislação que incluiu os homens na licença parental e estendeu o descanso para 20 dias. Benefício ocorre apenas no âmbito das empresas sob o regime de Lucro Real, que desfrutam dessa regulamentação, como parte do programa Empresa Cidadã, sendo necessário ampliar o seu alcance e a discussão sobre o tema.
Neila lembra a situação de insegurança que antecede o momento da licença parental, que em uma realidade de trabalho mecanizado, se traduz em medo de retaliação após-licença, demissão ou outras práticas não incomuns em empresas de gestão mais tradicional.
A pandemia, contudo, forçou o processo de humanização das empresas, lembra Flavia, mostrando a necessidade de mudar essa realidade. A executiva entende que a licença estendida, em público ou prazo, precisa ser oferecida sob diálogo aberto, reconhecendo necessidades específicas e contras de cada modalidade.
“A mudança deve acontecer quando essas pessoas fizerem parte do poder decisório”
O último painel tratou de mostrar como valorizar a cultura negra dentro da empresa, para além do Dia da Consciência Negra, na presença de Daniele Mattos, co-founder e Sócia na Indique Uma Preta; Gilberto Costa, diretor executivo do Associação Pacto de Promoção da Equidade Racial, e Lucas Morais da Silva, gerente de Diversidade e Inclusão da Dasa.
Daniele, em sua opinião, entende que lideranças pretas podem fazer diferença estrutural nas companhias. “A mudança deve acontecer quando essas pessoas fizerem parte do poder decisório”, afirma a executiva.
Costa, lembra ação da B3 para fomentar maior presença de mulheres e negros nos conselhos administrativos das empresas. “Obviamente as organizações estão em diferentes níveis de maturidade”, ressalta o executivo, certo de que é preciso abrir o diálogo e oferecer um letramento no tema.
Silva, por sua vez, lembra que essa presença não pode ser um “totem” e essa conversa deve ser ampliada, sendo este apenas um primeiro passo em direção à inclusão. E preconiza que, para o avanço de discussões sobre o tema, “Ética” deveria ser uma disciplina importante, ou, no mínimo, aplicada ao contexto das formações profissionais.
Para assistir ao primeiro dia do evento clique aqui.
O segundo dia está disponível neste link.
Reportagem e texto: Jussara Goyano / Portal Melhor RH