Por Marcelo Daniel
A tela corre rapidamente com a velocidade da atualização dos perfis. Discussões ideológicas e políticas, memes, gifs de pets aprontando alguma, tudo corre perfeitamente bem até que… Uma nova informação é lançada e todo o ritmo da rede social se altera: uma possível queda de aeronave; um ônibus sendo incendiado; o relato de uma agressão; um desfecho político. São inúmeros os casos, mas o resultado é sempre o mesmo — o que era um simples tweet virou a manchete da semana.
“Não dá para dissociar o Twitter de notícia. É um aplicativo de informação. Costumo dizer que ele não é uma rede social, mas uma rede de interesses. As pessoas vêm para saber basicamente o que está acontecendo”, explica Leonardo Stamillo, diretor editorial para América Latina do Twitter. Ele exemplifica ao apontar que o Brasil inteiro está acompanhando a Lava Jato pelo Twitter ou na tragédia com o avião do time de futebol da Chapecoense, por exemplo, as equipes de TV que estavam fazendo a cobertura 24 horas do ocorrido. “As primeiras informações, os primeiros vídeos e as primeiras fotos chegaram pela plataforma”, diz.
Lançado nos Estados Unidos em 2006, o microblog vai completar 11 anos e segue firme em sua proposta de ter seus posts com apenas 140 caracteres. Claro que, com o passar do tempo, outras ferramentas foram incorporadas, como a possibilidade de se colocar fotos, vídeos nativos, gifs animados e transmissões ao vivo. E os recursos têm facilitado o dia a dia das redações, principalmente no levantamento de pautas. “Detecção, produção, distribuição e engajamento, o Twitter tem soluções que são muito eficientes e nós desenvolvemos ferramentas para ajudar com isso”, diz Stamillo. Ele ressalta a proximidade que a equipe de jornalistas da empresa vem desenvolvendo com repórteres e editores. Em alguns casos, foram inclusive firmadas parcerias com a operação local do Twitter For News (@TwitterForNews), que possibilitaram um corpo a corpo nas redações para espalhar boas práticas e inovação desses profissionais. Com foco em facilitar a busca pelas melhores histórias, a equipe do Twitter for News também coordena o Twitter Moments Brasil. O Moments exibe uma seleção de conteúdos em editorias como Notícias, Esportes, Entretenimento e Diversão e a curadoria é feita por um time de jornalistas de plantão e possui parceria de grandes empresas de comunicação na produção desse material. O que torna a plataforma cada vez mais um palanque de informações para seus usuários tanto consumirem quanto produzirem conteúdo.
A rapidez do Twitter também tem sido aproveitada em coberturas de eventos, muitas delas em parcerias firmadas entre a empresa e os veículos de comunicação. Caso recente foi o trabalho realizado em conjunto com o Portal Omelete, que fez vídeos e Moments semanais exclusivos para a premiação do Oscar 2017. “É uma das épocas do ano em que mais temos procura por conteúdo e quando também produzimos novos vídeos e textos — e ter o microblog como parceiro na distribuição de tudo isso e ainda trazendo uma interação com o público amante de cinema é algo que nos deixa ainda mais empolgados”, comenta o diretor de marketing do site de cultura pop, Marcelo Forlani.
Oficial
Esse processo e o poder de alcance da informação fica mais evidente com o uso do Twitter pelo presidente norte-americano Donald Trump. Qualquer tuíte do político torna-se manchete e é considerado como uma espécie de “declaração oficial”. “Trump se comunica, via rede social, sobretudo com a mídia, menos do que com seus seguidores, a meu ver. Por isso, temos uma presidência e uma política externa via Twitter – tudo o que ele posta é exagerado, amplificado”, observa Lúcia Guimarães, jornalista que desde meados dos anos 1980 é uma voz brasileira na produção de informações na sua base, em Nova Iorque, nos Estados Unidos, e atualmente assina pautas internacionais no O Estado de S. Paulo, onde é colunista e correspondente. “O Twitter me informa como uma agência de notícias, mais rápido do que buscas, por exemplo, no Google News”, afirma.
Além de tuitar em inglês e português sobre seus pontos de vista e seu cotidiano, o perfil @luciaguimaraes faz uma curadoria de artigos de veículos nacionais e, principalmente, internacionais. As mensagens são compartilhadas e os RTs (retuítes) sempre acompanham algum comentário da jornalista, como se fosse uma espécie de “chapéu” sobre o assunto difundido.
Comparando com os EUA, Lúcia acredita que o microblog ainda não tem a relevância equivalente no Brasil. “Infelizmente, o Facebook domina no país, o que provoca muito ruído e perda de tempo entre breaking news e mensagens de parabéns com bolos e velas. O Twitter em língua inglesa tem flagrantes pessoais, mas o fato de ser uma plataforma de mensagens curtas e ser vastamente usada por jornalistas o torna uma ferramenta mais produtiva”, comenta.
Apuração
Leandro Demori (@demori), escritor e jornalista da área de produtos digitais da revista Piauí, aponta que o fenômeno de geração de notícias é ainda mais forte quando a fonte primeira da informação a publica diretamente no microblog. Ele, que é membro do conselho fiscal da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (@Abraji), também acredita que o país ainda tem muito para avançar nessa vertente mais tecnológica da distribuição de informações — principalmente no ato de investigar determinado assunto.
“Tem muita gente que subutiliza o Twitter ainda, há muitas formas de usá-lo não apenas para produzir e colher informações, mas também na produção de dados; tem muitas maneiras de monitorar a rede e fazer scraping e baixar dados e por meio deles poder entender qual é o trending de notícias em determinada região do planeta”, explica. Scraping ou data scraping significa raspagem ou coleta de dados, um recurso que era muito utilizado no dia a dia de programadores na área de tecnologia da informação e que, cada vez mais, vem atraindo jornalistas na apuração de notícias.
Esses recursos tendem a continuar crescendo no Brasil. “Apesar de a gente ser muito social e usar muito a internet, acho que na parte dos produtores de conteúdo ainda falta caminhar e se qualificar um pouco mais; mas já andou muito, a internet, até 5 ou 6 anos atrás era vista como ‘lado B’ das redações”, explica Demori.
Nova ágora
Diego Escosteguy, editor-chefe da revista Época, faz um paralelo com a importância da rede social na sua atuação como jornalista de um grande veículo: comparando-a com a ágora de Atenas, um espaço público, fundamental para dizer, ouvir e trocar informações.
Enviado ao Haiti no ano de 2010 para a cobertura do grande terremoto, o jovem repórter já inovava com a então novíssima plataforma. “Eu a utilizei como ferramenta complementar à informação; eu tuitava para a Veja e marcava com a audiência para, às 20h30, responder dúvidas dos usuários sobre a catástrofe”, recorda-se.
Nos anos seguintes, percebeu que a importância do Twitter crescia em sua atividade profissional. “Servia para se aproximar das pessoas, criar uma relação de confiança e cultivar a audiência — e não só para abastecer o público, também recebi dicas e até documentos por causa dessas relações”, conta.
Outra função bastante explorada por Escosteguy na ferramenta é a criação de expectativa. “Quando temos uma matéria de impacto, um furo de reportagem, eu tuito uma espécie de teaser para envolver cada vez mais as pessoas nos assuntos que você está produzindo”, diz.
Com a operação Lava Jato e seus desdobramentos com a crise política, o perfil @diegoescosteguy entrou em ebulição. O jornalista passou a tuitar muitas vezes ao dia, com comentários, novidades sobre o andamento do caso e, é claro, convidando os leitores ao conteúdo da revista. Foi nessa época que passou a utilizar o Periscope, aplicativo do Twitter que permite executar transmissões ao vivo. “Fiz uma transmissão por volta de 1h30 da manhã sobre uma carta que o então vice-presidente Michel Temer havia escrito para Dilma e teve uma audiência absurda; o Periscope proporciona um trabalho de engajamento muito orgânico”, analisa.
Escosteguy classifica a rotina de postagens como algo “artesanal”, em que afirma cultivar fontes, fortalecer sua marca e a de sua publicação nas reportagens, ouvir e se relacionar com diferentes tipos de públicos. “Afirmo com tranquilidade que esse diálogo propiciado pela plataforma me fez ser um jornalista melhor”.
Rodapé
O jornalista gaúcho Mílton Jung sabe como poucos utilizar a capacidade intimista do rádio para se aproximar de sua audiência. Atuando em São Paulo desde o início dos anos 1990, além das ondas radiofônicas, praticamente todo conteúdo produzido pelo apresentador de atrações como o Jornal da CBN e criador de campanhas como a Adote Um Vereador são disponibilizadas em seu blog, que é freneticamente atualizado.
Não bastasse esse breve introito do poder de divulgação das palavras de Jung, nos últimos tempos ele vem se dedicando (e se destacando), também, na rede social dos 140 caracteres, sob o perfil @miltonjung. “Comecei a usar o Twitter no rádio em 2008 e naqueles tempos era comum os ouvintes perguntarem ‘o que é esse negócio de tuíter que você tanto fala'”, conta o radialista que, para incentivar o uso, promoveu um concurso no ar, sorteando um exemplar do seu livro Jornalismo de Rádio para quem melhor definisse a relação entre o aplicativo e o veículo. Curiosamente, já que o assunto é pioneirismo, a vencedora foi a jornalista e roteirista (e tuiteira) Rosana Hermann (@rosana) com a frase: “O Twitter é o rodapé do rádio”.
Na opinião de Jung, entre os dois meios de propagar informações, houve apenas uma diferença entre as gerações em que foram criados, pois suas funções são as mesmas: “instantâneo, veloz e objetivo”.
Além do seu perfil pessoal, com 170 mil seguidores, ele ainda trabalha com o perfil do @jornaldacbn, com 458 mil. “Apesar de diferenciar minha participação, sei que um influencia o outro e, portanto, tenho muito cuidado na hora de me expressar em cada um deles”, ressalta.
A emissora que tuíta
Essa interação com os chamados tuiteiros é outra faceta vital da relação entre veículos e o seu público. Como é o caso da ESPN Brasil (@ESPNagora). É quase impossível passar alguns minutos em frente a uma TV sintonizada no canal sem se deparar com o rosto de um tuiteiro ocupando algum canto da tela. “A ESPN e o Twitter são parceiros de longa data uma vez que a emissora valoriza muito a interatividade e a aproximação do fã do esporte trazida pela rede social”, afirma o diretor de Novos Negócios da emissora, Alexandre Biancamano.
“A interação dos tuiteiros com o nosso conteúdo ao vivo é uma forma de trazê-los para dentro da nossa programação e fazer com que se sintam parte do que é transmitido na TV, independentemente da modalidade”, comenta o executivo, que ressalta que, apesar de a prática ser bastante intensa na matriz nos EUA, ela é feita de uma forma diferente, atendendo às necessidades de cada mercado regional.
Além de possuir amplo espaço para tuítes na sua grade, a ESPN Brasil ainda incentiva seus colaboradores a interagir nos 140 caracteres, em contas pessoais. “O fato de entenderem a importância do Twitter e sua capacidade de engajamento junto aos fãs de esporte faz com que nossos profissionais da equipe de jornalismo sejam bastante ativos na plataforma”, ressalta Biancamano.
É o caso do jornalista Leonardo Bertozzi (@lbertozzi) e seus 326 mil seguidores. Além de resultados de partidas em tempo real, ele faz análise, comenta atuações com leveza e bom humor. A sua forte atuação na editoria também permite que seus seguidores acompanhem excelentes publicações da mídia internacional esportiva, com infografias e imagens diversas.
Por falar em gráficos, Bertozzi conta uma história interessante sobre o poder do Twitter no jornalismo esportivo que foi registrada após uma tuitada sua, contendo um gráfico que mostrava como o Atlético Nacional trabalhou a bola em um dos gols contra o São Paulo F.C., pela Copa Libertadores da América. “No dia seguinte, o tuíte foi citado no Redação SporTV pelo André Rizek, de maneira muito gentil, o que mostra que, no convívio virtual, não há separação de emissoras ou rivalidades – não sei se haveria a mesma repercussão se o conteúdo fosse exibido apenas na TV”, comenta.
“O TWITTER É UMA REDE DE INFORMAÇÃO”
Em 2014, Leonardo Stamillo foi o primeiro jornalista convidado a integrar a equipe do Twitter para a América Latina. No cargo de diretor editorial, está à frente da operação regional de setores como Twitter For News e, também, o Twitter Moments. A Negócios da Comunicação conversou com Stamillo no escritório do microblog, na Vila Nova Conceição, em São Paulo.
Vocês treinam e orientam jornalistas?
Quando a equipe do Twitter For News fez o programa de treinamento dos jornalistas, o Twitter Training Program, indo até grandes veículos de comunicação, o montamos pensando no ciclo da informação, a checagem. Desses 500 milhões de tuítes que são produzidos todos os dias, como faço uma lista para encontrar os mais relevantes? Para receber um alerta quando uma pessoa tuitar sobre uma explosão? A gente fez todo um treinamento para configurar o TweetDeck para isso. Detecção, produção, distribuição e engajamento, o Twitter tem soluções que são muito eficientes e nós desenvolvemos ferramentas para ajudar.
Qual a melhor maneira de usar o Twitter no jornalismo?
Há exemplos de jornalistas e perfis de veículos que entenderam perfeitamente a função de um tweet storm, quer dizer, da tempestade de tuítes ou live tweeting, que é quando você tuíta em tempo real o que está acontecendo. Eles catalisam o público, mantêm as pessoas conectadas e aproveitam tudo aquilo que a plataforma oferece. Em uma janela de 18 horas após um acontecimento, o Twitter é uma rede social imbatível no engajamento. Se eu consigo ter um fluxo de tweets que acompanha essa janela, é claro que vou me beneficiar, vou conseguir impressões maiores sobre o meu conteúdo.
Há casos em que usar apenas para divulgação de links do seu próprio conteúdo também é eficiente?
Tem veículos que usam o Twitter como um gatilho de links. E a gente comprova por meio de gráficos que a audiência dele é muito menor do que os que tuítam de uma forma mais estratégica. A verdade é que eles não estão aproveitando o que a plataforma tem de melhor e ninguém conversa com um robô. Se você quer de fato engajar com a audiência, é necessário tuitar de uma forma mais orgânica. No Brasil ainda há alguns poucos veículos que acreditam que não podem tuitar muito pois vão incomodar o usuário. Quando você tuíta, se o usuário não tiver ativado as notificações, não será impactado. Muito pelo contrário, é um raciocínio muito parecido com o do rádio: se a informação é importante, a gente a oferece novamente para o usuário.
Existe alguma aplicação prática no mercado que trate dessa relação?
O The New York Times engaja com os tuítes da sua própria redação. Afinal, eles são funcionários do NYT e, se o jornal endossar essas informações, elas têm muito mais peso. A empresa ganha muito mais velocidade, pois todos estarão tuitando as informações que estão sendo apuradas. É claro, corre-se esse risco de alguém talvez postar um fato precioso e a direção do jornal apontar: “isso tinha de ser dado primeiro no site”.
Ferramentas para o trabalho diário nas redações?
Sim. Uma ferramenta desenvolvida, e que hoje é até uma empresa fora do Twitter, é o Data Mining. Durante um ano, jornalistas do microblog com a emissora norte-americana CNN se debruçaram sobre um problema: identificar breaking news dentro de tuítes de usuários. Observar uma coisa que acabou de acontecer e ainda não foi noticiada. Hoje, nós temos um algoritmo que consegue identificar o padrão de comportamento de um tuíte que vai se tornar breaking news, após um tempo. A ferramenta vai mandar um alerta para o jornalista, sob diferentes temperaturas conforme a relevância. Junto com a notificação, ele recebe a postagem, quem é o autor, quão próximo ele está do fato que está narrando e o histórico desse usuário na plataforma. E daí o repórter toma a decisão se deve checar ou não essa informação. Essa é uma ferramenta em uso no Brasil, a TV Globo, por exemplo, a utiliza há algum tempo.
No exterior, os veículos estão mais avançados no uso do Twitter?
Não. Pelo contrário, já exportamos alguns cases bem importantes, como uma experiência com o jornal Estadão em que desenvolvemos um widget que capturava todos os tuítes que falavam sobre as linhas de trem do metrô de São Paulo, por quase dois anos no ar. Na Copa do Mundo, iluminamos o Cristo Redentor com as cores da Alemanha e da Argentina conforme o número de tuítes que a plataforma recebia.