Contratações flexíveis para atrair as novas gerações

Pacotes de benefícios muitas vezes são engessados pela legislação e acordos sindicais, mas sua flexibilização atende à demanda de gerações mais jovens, que também exigem mais feebacks

As gerações Z e Alpha entraram no mercado exigindo mudanças: não querem apenas emprego, salário e benefícios básicos de mercado. Querem viver mais e trabalhar menos, uma aparente contradição da lógica empresarial dominante, pois esse pensamento caminha para a contramão do emprego formal.  Na verdade, essa conversa atinge outras gerações pregressas, conforme lembra a música de Tim Maia: “Não me falem em trabalho, eu quero sossego”, dos anos 80. Na verdade os “Zs” não querem fugir do trabalho formal, só querem um ambiente mais amistoso. Além disso, a pressão por retenção muitas vezes paralisa o feedback, tornando as conversas evasivas e pouco aprofundadas, enquanto os problemas continuam crescendo sem resolução. De acordo com o Gallup, colaboradores que recebem feedback significativo têm 3,6 vezes mais chances de se engajar em suas atividades. Então, existe luz no fim do túnel para atrair e reter a nova geração de entrantes no mercado.

Carolina Ferreira, da Alelo: carreiras com propósito

Falando no que mudou nas estratégias de recrutamento e a entrada das novas gerações no mercado de trabalho nos últimos cinco anos, Carolina Ferreiradiretora de Gente e ASG da Alelo, diz que essa nova geração tem outra lógica, voltada ao propósito, flexibilidade e conquistas nas carreiras. E o RH deixa de ser uma área operacional, para uma área estratégica que promove experiência, jornadas nas carreiras e especificidades das gerações. “Aqui na Alelo falamos de flexibilidade com responsabilidade; humanização no modelo de gestão e nos processos; uma escuta genuína, colocando as pessoas como protagonistas”.

Em virtude disso, “a Alelo adotou um modelo hibrido de trabalho, com ida ao escritório três ou quatro vezes semanalmente, dependendo da área, o que foi uma aspiração dos colaboradores”. Flexibilidade é o business core da Alelo, até por ser uma empresa líder em seu segmento, segundo a gestora da empresa. “Flexibilidade é mais que um benefício, dialoga com a marca empregadora. O que também comunica confiança e autonomia, e uma nova forma de medir a produtividade”. E os benefícios internos da empresa são os mesmos que oferecemos ao mercado, “respeitando a legislação. Para isso, mantém um estilo de gestão com escuta ativa, escuta genuína, para tomarmos as melhores decisões, sempre colocando as pessoas como protagonistas”.

Novas gerações no mercado

Maria Sartori, da Robert Half: nova geração mais crítica

Maria Sartori, diretora de Mercado na Robert Half, complementa colocando que as gerações Z e Alpha entraram no mercado de trabalho durante ou no pós-pandemia, o que levou todos os profissionais de todas as gerações a repensar as expectativas e propósitos de trabalho. “Essa nova atmosfera forjou toda uma geração a ser mais seletiva e critica”. Destacou que sua empresa faz cerca de 500 a 600 movimentações no mês, um volume bem alto e percebe-se a mudança nestes últimos cinco anos trazidas por essa nova geração. “Antes, quando iniciávamos o processo seletivo, numa primeira abordagem, falávamos de salários e benefícios. Hoje, existe uma mudança forte, as perguntas dos candidatos se tornaram mais criticas, voltadas ao modelo de trabalho, se híbrido ou remoto, qual flexibilidade no trabalho, cultura e valores da empresa. Já no início do processo sentimos uma criticidade maior, que eu avalio como positiva”.

 

Mavichian, da Companhia de Estágios: seleção humanizada –  Foto: Germano Lüders

Tiago Mavichian, CEO da Companhia de Estágios, especialista no tema, pois sua empresa é focada em programas de entrada com seleção humanizada, diz que “antes considerava uma pessoa para a vaga pela sua formação, conhecimento, se morava próximo; e, do ponto de vista do candidato, este dizia apenas querer uma vaga de trabalho. Hoje, o candidato questiona mesmo o modelo e as condições de trabalho. Fizemos experiências no Metaverso e na Inteligência Artificial, encurtamos o processo de recrutamento em suas etapas e investimos mais em comunicação, pois todas as vagas da companhia são divulgadas agora no WhatstApp e nas redes sociais para gerar mais engajamento. Mudou radicalmente a forma de contratar nos últimos cinco anos. Tem muita escuta ativa. Fizemos uma pesquisa que apontou que 96% dos jovens revelam ser muito importante o equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Quando perguntamos sobre conquistas pessoais, casa, carro, etc, 97% dizem que vão se esforçar muito para conseguir esses objetivos. Querem o melhor dos dois mundos. Buscam flexibilidade, desafios, reconhecimento e conquistas materiais”. Entra aí o fator flexibilidade. E se alinha à marca empregadora.

E também citando uma pesquisa que se repete há dois anos, voltada à felicidade no trabalho, destacando o modelo de trabalho com um recorte geracional, Maria Sartori diz que “Hoje, 42% das empresas no Brasil estão num modelo 100% presencial. E 30% das empresas estão num modelo chamado de híbrido, mas não flexível, com os colaboradores indo de duas a três vezes por semana ao escritório, e a empresa que determina quais são esses dias. E, num processo de comunicação, de escuta ativa, quando perguntamos para o público qual o modelo preferido para trabalhar, todas as gerações preferem o modelo híbrido e flexível”. O que chama a atenção nessa pesquisa é que, nas gerações anteriores, fazendo a mesma pergunta, cerca de 35% comentam o modelo híbrido 100% flexível. A nova geração tem 50% de expectativa em um modelo mais flexível e, caso exista uma mudança desse modelo de trabalho, começa a olhar proativamente para o mercado. E quer um modelo de trabalho com pouca hierarquia. Mais líderes e menos chefes.

Employer branding

Entretanto, Maria Sartori diz que é preciso ter cuidado no ritmo dessas mudanças. “Muito se fala de employer branding, de como atrair e como reter esses profissionais dentro da empresa.  Por ser uma geração que busca muita autenticidade a palavra de ordem é transparência. E isso começa no processo seletivo, na divulgação das vagas. É preciso detalhar a cultura, o que se espera do candidato, o que a empresa oferece e o que ela não oferece”. Outro ponto que ela destaca é oferecer feedback do resultado do processo, seja ele positivo ou negativo. “Isso tem tudo a ver com employer branding”.

E employer branding começa no processo seletivo. “Os candidatos hoje têm acesso a todas as plataformas digitais e eles comparam e escolhem. Se vendemos determinada posição da empresa para o candidato, depois de uns três dias eles nos questionam sobre algo que falei e eles dizem que não viram isso em determinada rede social. Por isso o processo seletivo tem que ser transparente. Não tem como maquiar as informações, e está disponível em todas as plataformas, e os candidatos estão mais críticos”, aponta a diretora.

Transparência e humanização são palavras-chave para Mavichian. Sua empresa pergunta aos candidatos o que eles mais odeiam nos processos de seleção, e no top 3 fica a questão do contato, tentar falar e não conseguir. “Tem consultoria que é mestre em esconder telefone, e-mail, contato. Isso desgasta o candidato.  Fazemos o oposto, aumentamos nossos canais de contatos”. Por outro lado, ele confirma que o que os candidatos mais questionam no processo é sobre aprendizados e desafios. Isso para uma vaga de jovem aprendiz ou programa de estágio.

“O jovem profissional precisa se sentir desafiado”, complementa Maria. “O propósito que dá sentido para o trabalho”, resume Carolina, ambas concordando com o mesmo conceito.

Num processo de muitas vagas, a humanização e a escuta ativa são fundamentais. “Humanizar não é perder eficiência”, diz Carolina. Para nós, é gerar uma conexão verdadeira. Tivemos esse problema quando evoluímos para processos digitais, incluindo etapa de recrutamento online, e as pessoas sentiram falta do contato humano. As pessoas e as empresas começaram a sentir falta desse atendimento humanizado ao longo do processo e hoje buscamos equilíbrio. O processo seletivo também comunica a cultura e os valores da empresa”.

Benefícios mais cobiçados

Acciarto da 2 Spread: colaboradores querem mais flexibilidade

Falando a respeito do peso de política de benefícios na decisão de um candidato ou na permanência de um colaborador, Renato Acciarto, diretor de Estratégia de Comunicação Corporativa e de Relações Institucionais da 2 Spread Comm, cita pesquisa da Gympass, com mais de 9 mil profissionais: 82% dos colaboradores trocariam benefícios por uma rotina de mais bem-estar e flexibilidade. “E o RH tem um papel difícil, pois as empresas querem mais resultados e funcionários querem mais flexibilidade. Os benefícios tradicionais estão ficando obsoletos, por isso devem ser mais flexíveis.”

Távira Magalhães, CHRO (Diretora de Recursos Humanos) da Sólides, também cita uma pesquisa que sua empresa fez no início do ano a respeito do panorama de empregabilidade e, entre os resultados, 70% dos entrevistados responderam que os benefícios poderiam ser melhorados. “Benefícios passam a ter uma representação grande para as pessoas, pois a remuneração é composta por salários mais benefícios”. Benefícios que façam sentido para os colaboradores. Pessoas querem participar da escolha dos benefícios. Como a questão da flexibilidade, além da carga horária, olhar com mais clareza as funções, os entregáveis, os propósitos da pessoa e os valores institucionais que comungam com o candidato.

Távira Magalhães, da Sólides: candidatos agora escolhem as empresas

“É uma via de mão dupla”, continua Távira, “e os candidatos têm mais de uma proposta para escolher e procuram valores que estejam mais alinhados com o que desejam”. Em termos de benefícios, continuando a pesquisa citada, plano de saúde aparece em primeiro lugar, o mais procurado, com 19%; em segundo lugar vem o vale alimentação, com 10%; e em terceiro lugar empata segurança psicológica com horário flexível, ambos com 9%. E a diretora da Sólides destaca que tem coisas que não se pode flexibilizar pelas convenções coletivas do trabalho pactuadas com sindicatos.  “Mas tudo deve ser transparente na hora da entrevista”. O plano de saúde continua a ser o mais importante para os entrevistados, com 19%; em segundo, o vale-alimentação, com 10%. Em terceiro lugar, empatam segurança psicológica — lugar de escuta que normalmente é feito em uma empresa conveniada — e horário flexível, ambos com 9%. Tudo é uma composição. “Quando falamos de felicidade, é uma discussão muito ampla, porque felicidade é um estado emocional. E o que provoca esse estado emocional numa pessoa é perceber o que traz valor para ela. Benefícios fazem a diferença e 70% das pessoas falam que podem ser melhorados. Mas entram na soma benefícios, facilidades e o ambiente”.

Outro aspecto detectado pela pesquisa da Sólides é o aspecto de visão positiva da vida dessas novas gerações. E, números: 83% de otimismo na geração Z e 84% de otimismo na geração Y. De qualquer forma, Távira avalia que a descrição do job e expectativas das pessoas, fruto de negociação no processo seletivo, devem ser informadas às lideranças diretas dessas pessoas, para manter o engajamento na permanência no emprego. Não é apenas olhar para a carga horária, mas também para os propósitos, valores institucionais que comungam com os valores do colaborador. “Hoje o recrutamento é uma via de mão dupla: a empresa escolhe o candidato e também o candidato escolhe a empresa”.

Dani Pesnik: flexibilidade como diferencial / Foto: Edu Vieira

Dani Plesnik, educadora, palestrante e executiva de RH, tem estudado muito a questão da felicidade no trabalho, chegando a conclusão que, no Brasil, benefícios ainda são focados no indivíduo. “Academia, meditação afetam o bem-estar do indivíduo, claro. Mas deve ter que olhar para a cultura corporativa também”. Pesquisa citada no livro Why Workplace Wellbeing Matters, de De Neve e Ward, publicado em 2025 [sem tradução no Brasil], fez um levantamento com 20 milhões de colaboradores e apontou que a forma como o trabalho é desenhado, organizado e gerenciado afeta muito a decisão do candidato e do colaborador. “Flexibilidade afeta o bem-estar. Tem questão de causalidade, a independência do profissional é importante e, se não encontrar no local de trabalho, irá buscar em outras empresas. Seria um diferencial. E, para cada perfil de funcionário, o tipo de benefício pode ter pesos diferentes; uns querem mais assistência médica, outros podem querer outro tipo de benefícios. Essa flexibilidade precisa ser adotada. Para que o funcionário tenha flexibilidade para usar melhor o benefício”. A questão, segundo Dani, não é a quantidade de horas trabalhadas, e sim a forma como nós trabalhamos.

Outro ponto é saber que é um benefício de fato. Dani critica uma visão recente que achava que oferecer piscina de bolinha ou pebolim num espaço de descontração da empresa era um benefício. “Essa fase já passou, apesar de algumas empresas ainda oferecerem isso. O importante é o respeito ao profissional, entender o olhar de cada um.


Esses temas foram discutidos no 5º Fórum Melhor RH Felicidade Corporativa

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