Jornalistas negros (as) continuam minorias nos meios de comunicação

E não só no jornalismo. A diversidade racial também é minoritária no audiovisual, na autoria de livros, como atores e influenciadores

Apesar dos avanços negros ainda enfrentam dificuldades no mercado de trabalho do jornalismo, no segmento editorial, audiovisual e nas mídias digitais e sociais em geral.

Na TV aberta, cabo e streaming, nos últimos anos, marcas e empresas têm apostado na diversificação de gêneros e raça em suas campanhas e programação, porém ainda não é o ideal. Segundo pesquisa “Refletindo-me: Representação Global na Tela”, feita pela Paramount Global, em 15 países, incluindo o Brasil, apenas 23% dos entrevistados afirmam que se sentem representados. 

Ainda não há igualdade entre negros e brancos no Brasil, mesmo com 56%, ou cerca de 120 milhões, da população se declarar negra, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas. Essa maioria não se sente representada nas produções audiovisuais.

No jornalismo, negros representam menos de 1/3 das redações, segundo o estudo realizado em 2021 pela Universidade Federal de Santa Catarina em parceria com a Retij (Rede de Estudos sobre Trabalho e Profissão), da SBPJor (Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo), sendo 29,9% negros (pretos e pardos).

Outra pesquisa, intitulada “Perfil Racial da Imprensa Brasileira”, e divulgada agora pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), reforça, que ainda há desigualdade na profissão. O levantamento mostra que 61,8% cargos gerenciais das redações são ocupados por profissionais que se declaram brancos, e apenas 40,9% desses vagas ocupacionais são negros. Profissionais da imprensa, coletivos e parte da sociedade civil têm pedido maior representatividade nas produções audiovisuais em várias áreas.

A apresentadora escritora Clarice Miranda acredita que ainda não há democratização da informação para negros. Ela defende que, mesmo com novos meios, ainda é necessário grandes empresas de comunicação dar voz à causa das minorias. “Democratizar a informação depende que queiram que a informação chegue, porque nós já estamos fazendo o nosso. Estamos há centenas de anos nos adaptando, precisamos de um apoio e fazer a nossa rede de apoio”, afirmou Clarice durante painel da Expo Favela São Paulo. 

Da mesma opinião compartilha Elísio Lopes Júnior, dramaturgo e roteirista da TV Globo. Ele lembra que por muito tempo a mídia tradicional controlou o conteúdo audiovisual que era passado para o público, porém com a Internet novas vozes e canais foram surgindo. O escritor ressalta que grande parte da sociedade se informa pelas TV e grandes portais de notícias: “A mídia tradicional não está mais no centro, ela não define mais quem fala e quem aparece, mas se eu quiser divulgar um filme ou uma peça, dependo dessa mídia para ter destaque. Este fenômeno cria bolhas, mas o eixo não está mais nestes meios”. 

O humorista e influenciador, Eddy Junior afirma que sempre gostou de humor e viu nas redes sociais um meio de fazer o que gosta, porém o comediante lembra que quando era criança havia poucas referências negras no humor, e quando havia era de maneira estereotipada: “Desde a infância minhas referências não eram pretas, por isso fiquei com receio de fazer humor. Mas hoje eu sou referência para outras pessoas. É muito importante estarmos nestes espaços”. 

Marcas precisam estar atentas às mudanças 

Clarice acentua a maior reclamação entre influenciadores que representam alguma minoria: a falta de visibilidade pelas marcas. Segundo estudo realizado pela Black Influence, o Site Mundo Negro e o YouPix, influenciadores e profissionais do audiovisual negros são os menos contratados para campanhas.

Esse cenário não está restrito apenas a influenciadores e profissionais do audiovisual; trabalhadores pretos ganham 40% a menos do que funcionários brancos, aponta a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), realizada pelo IBGE. 

A escritora, que também integra o Centro Afrocarioca de Cinema, afirma que ainda é preciso ter uma rede de apoio para poder realizar projetos voltado ao público negro“As marcas estão começando a perceber que consumidores. O aquilombamento que temos é necessário para criarmos a nossa rede de apoio”.  

O cantor Salgadinho aponta que o investimento da iniciativa privada ainda é pouco para artistas e influenciadores negros, por isso, uma das saídas é a criação de redes de apoio de artistas negros “Aquilombamento é importante porque faz sobreviver nossa cultura. Mas, precisa expandir o setor privado, nos patrocínios e políticas públicas, acho que poderíamos ter mais vitórias da cultura periférica”

O futuro será melhor 

Apesar do fenômeno recente na internet,  alavancado pelo público das redes sociais que pedem cada vez mais representatividade influenciadores e profissionais do audiovisual acreditam que cada vez mais haverá mudanças na representatividade de negros

Para o ator, Babu Santana  cada vez mais o público vai exigir se sentir representados em novelas e outras produções. “Espero que as gerações futuras colhem os frutos, hoje temos várias lideranças, a tendência é melhorar. É pra frente que se anda”, declarou.

Elísio acrescenta que o ritmo do avanço é igual ao que conseguimos produzir, para isso é preciso que pretos estejam presentes cada vez mais no audiovisual. “Antes a câmera não estava voltada para nossas narrativas e agora temos a oportunidade porque isso é um processo de construção, as pessoas não querem mais consumir um produto que elas se não veem”, finaliza o roteirista da Globo. 

Redações tem problema de diversidade

O mercado e trabalho para jornalistas em redações é seletivamente e majoritariamente branco e heterosexual. O assunto também foi discutido em fórum da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), com o tema Diversidade, Equidade e Igualdade Racial, realizado na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).

Repórter do Uol Notícias, Caê Vasconcelos destacou a sua condição de homem trans, bissexual, no livro “Transresistênia: Pessoas trans no mercado de trabalho”, o preconceito de parcela da sociedade em relação ao assunto e como a imprensa pode ser fundamental para a quebra desse paradigma.

Secretária de Gênero, Raça e Etnia da  Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), Valdice Gomes lembrou que recente pesquisa realizada entre jornalistas empregados nos principais veículos de comunicação, identificou que apenas 20 por cento se declararam pretos, o que enseja a necessidade do aumento da presença desses profissionais nesses veículo, como forma de garantir, por exemplo, a produção de pautas que possam atender à necessidade de enfrentamento ao racismo em todos os segmentos.

Criador há 10 anos da rádio indígena Yandê (Somos nós) e estudante de jornalismo, Anapuaka Tupinambá, difunde entre os comunicadores indígenas a etnomultimídia, resumida por ele como um método de “produção de suas próprias narrativas, que diferem daquelas realizadas por comunicadores não indígenas”.

Editora de Diversidade do jornal Folha de São Paulo, Flavia Lima, coordenou os dois primeiros programas de treinamento voltados exclusivamente para profissionais negros. Disse que esse processo vem evoluindo até mesmo como aprendizado para o próprio veículo.

Repórter das rádios Tupi, Nacional e da extinta TV Manchete, a jornalista Iris Agatha, abordou sua pesquisa sobre o Movimento Negros, entre 1975 e 1985 no Rio de Janeiro, tendo como escopo as divergências entre a black music e o samba de raiz.

Ex-Editor Adjunto do Jornal O Globo e criador da página Quarentena News no Facebook, Jorge Antonio Barros, descreveu alguns momentos importantes de sua carreira como a produção de uma reportagem especial para o Jornal do Brasil sobre a chegada da cocaína vinda da Colômbia, aos morros do Rio de Janeiro e a especialização em segurança pública, com um viés em defesa dos Direitos Humanos.

O presidente da ABI, Octávio Costa respondeu uma pergunta sobre o jornalista e ex-deputado federal, Carlos Alberto de Oliveira, o Caó, e destacou a sua importância para a valorização dos jornalistas negros, num período em que a presença de negros e negras nas redações era menor ainda que nos dias atuais.

Esta matéria faz parte das homenagens ao Dia do Jornalista (7 de abril), e é um oferecimento de:

 

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