Americanas perde preponderância na venda de livros na volta às aulas

Imbróglio das dívidas milionárias da empresa afetou o mercado editorial. Livrarias também enfrentam dificuldades

O Procom-MG multou em R$ 11 milhões a Americanas SA, nesta terça-feira (3) por descumprimento de ofertas (inclusive no site), cancelamento de compras, e falta de produtos em estoques. Foi relativo ao período de volta às aulas, época com maior compra de livros didáticos, paradidáticos e outros materiais escolares. É mais um capítulo das “inconsistências contábeis” descobertas nos balanços da empresa, que reconhece um rombo de R$ 43 bilhões, a maioria dívida com bancos e entrou em recuperação judicial. Em várias cidades o movimento nas lojas foi nitidamente menor que em outros anos e até faltaram os tradicionais jornais de ofertas, impressos.

Nesta semana passada o assunto no setor de livros foi a dívida da Americanas com as editoras e distribuidoras, estimada em torno de R$ 100 milhões. Foi mais um golpe duro no segmento que encolheu 39% de 2006 a 2021, segundo dados da Nielsen — embora tenha ocorrido um aumento de faturamento no mercado editorial em 8,33% em 2022.

A dívida atinge 75 editoras, fora as distribuidoras, entre elas, grandes empresas como Companhia das Letras, Record e Intrínseca. A maior dívida é com a Somos Educação, no valor de R$ 14,2 milhões. Curiosamente, a Americanas. em meados de 2015, anunciou a venda de seus ativos editoriais e educacionais por R$ 725 milhões para a Somos Educação, na época pertencente a Abril Educação.

As editoras, coletivamente, irão discutir o assunto dívidas com a Americanas no dia 8 de fevereiro, em reunião no Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL).

A divida com gráficas ainda não foi apurada.

Recordando a Saraiva, Cultura e outras…

O setor de livros mal saiu de outra crise recente envolvendo megalivrarias como Saraiva e Cultura, e também a Laselva — a rede pediu recuperação judicial em 2013, com dívidas de R$ 120 milhões, e teve falência decretada em março de 2018. A Saraiva foi a maior livraria do Brasil, presente em inúmeros dos shoppings centers. Foi também uma das primeiras lojas online do Brasil. Comprou a rival Siciliano (em, 2008, ano que o cartão Saraiva Plus contabilizava mais de 2 milhões de associados) e tudo parecia ir de vento em popa nas suas 112 lojas. Mas aí apareceram as dividas, assumidas em R$ 675 milhões, e a rede de livraria vinha atrasando fornecedores antes do processo de recuperação judicial, que começou em outubro de 2018.  Propôs um plano de negociação de dívidas ao Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL) que não foi pra frente. Tentou vender a operação, mas ninguém quis o elefante branco.

A Livraria Cultura, que também assumiu o controle e uma concorrente a Fnac, com suas 12 unidades, em 2017. E, surpreendentemente, poucos meses depois, optou por um processo de recuperação judicial alegando dívidas de R$ 285 milhões. Agora, a Cultura, referência da efervescência cultual paulistana, teve a falência decretada, e os seus fiéis clientes estão pávidos ao assistir a retirada dos livros da tradicional loja por parte de grandes editoras (os livros são consignados e somente a Cia. das Letras deve pegar de volta 15 mil obras), receando o fechamento definitivo do ponto e até uma lacração do local por ordem judicial. O CEO da Livraria Cultura disse que tentará reverter o processo de falência na Justiça, e tenta acalmar os editores.

Há alguns anos, em 2005, assistimos também o triste fechamento da Livraria Belas Artes do professor universitário José Luiz Goldfarb (que coordena a pós-graduação em História da Ciência na PUC-SP), e também uma das lideranças religiosas e culturais no Clube Hebraica. Mas fechou pela mudança no mercado editorial da cidade e do país, a concorrência das megalivrarias e as vendas pela internet. Era bem administrada e tocada diretamente pelo dono, que costumava ser visto no local recomendando livros, conversando com leitores e administrando o caixa pessoalmente.

Americana vendia bem livros

Essas livrarias tradicionais culparam a política de preços predatória da Amazon, a principal concorrente das livrarias físicas, como um fator importante para a crise das livrarias tradicionais. Mas o Caso da Americanas foi bem diferente, pois a empresa também era forte no e-commerce (dona da Americanas.com E também do Submarino e do Shoptime).

Laselva, Saraiva e Cultura colocaram em situação difícil várias pequenas e médias editoras. A Americanas trabalhava praticamente apenas com os grandes players do setor de livros. Era uma das maiores vendedoras do varejo de livros, tanto em lojas físicas como via internet. Não trabalhava com consignação, como fazem as livrarias, mas adquiria livros das editoras para pagar depois. Com o calote, as editoras ainda ficaram com o compromisso de pagar os royalties para os autores, mesmo sem ter recebido pelas vendas.

O Grupo Record, por exemplo, tem R$ 7 milhões para receber da Americanas. Recebendo ou não, até porque os livros foram vendidos nas lojas, a editora terá que bancar R$ 1,5 em direitos autorais, segundo declarou a presidenta do Grupo, Sônia Machado Jardim.

Somente as dívidas com didáticos são estimadas em R$ 25 milhões.

Outras dívidas

As dívidas da Americana podem crescer se considerar outros processos que está enfrentando na Justiça em função da atual crise:  O Instituto Ibero-Americano da Empresa, que representa os investidores da companhia, pediu um processo de arbitragem na B3 contra o varejistas e os três principais acionistas, Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sucupira. Pede indenização de R$ 500 milhões como reparação pelo rombo milionário nos balanços e quer obrigar que o trio de controladores indenizem com recursos próprios a própria empresa. Consideram que os acionistas principais e executivos foram beneficiados indevidamente com bônus e dividendos irreais que não poderiam ter sido distribuídos nos últimos anos.

Esse, e outros pedidos de indenização, segundo o mercado, podem chegar a mais de R$ 1 bilhão.

Da parte dos empregados, apesar de não se ter notícias de demissões significativas, apenas do corte de terceirizados, o que do ponto de vista prático, é quase a mesma coisa, a empresa, segundo sindicato de trabalhadores, já possui 17 mil ações trabalhistas, somando R$ 1,53 milhões.

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