Basta um clique

Recomendação de conteúdo se consolida como ferramenta de monetização para sites e agências

Em uma edição do site Folha de S.Paulo, uma reportagem recebe destaque na home. Ao entrar na notícia, abaixo do texto e dos comentários dos leitores, a página na internet do maior jornal do país vai exibir, com opção de clique, um espaço intitulado Recomendadas para você. Nesta área, cada vez mais comum em sites de notícias, estão outras três manchetes da própria Folha. Juntos, claramente sinalizados, outros três links com conteúdos patrocinados (um produto, um curso, um evento), mas com chamadas em formato de manchete jornalística. É muito possível que o leitor desta revista já tenha se deparado com esse tipo de publicidade. Puxe pela memória: você já havia parado para pensar sobre isso? E mais: já clicou em um desses anúncios, de forma voluntária ou por desatenção? Provavelmente, sim.

Essas plataformas de descoberta ou recomendação de conteúdos são ferramentas com intensa adesão tanto por publishers quanto pelas marcas, nos dias de hoje. Esse serviço está também no site do jornal Valor Econômico, em diversas páginas de produtos da editora Abril, no portal R7, nas homes da CNN, Fox News, Chicago Tribune, MSN, ESPN. E muitos outros.
Em tempos de mudanças no jornalismo, com discussões sobre o futuro dos impressos e da veiculação de publicidade, esse modelo de monetização chama a atenção, tem se consolidado e ganha adeptos. Mas não são apenas elogios que recaem sobre a recomendação de conteúdos. Existem posicionamentos críticos relacionados à forma como essas notícias aparecem nos sites.
O The New York Times, por exemplo, trouxe em reportagem que os tais “links são, muitas vezes, anúncios de coisas e implantes dentários disfarçados de artigos de notícias”. Vale ressaltar que o próprio Times já se utilizou desses serviços para expor seus links em espaços de outros sites.

No Brasil, os players envolvidos no tema e ouvidos pela Negócios da Comunicação são todos cuidadosos ao falar dos riscos embutidos nessa estratégia. Com os devidos preâmbulos éticos necessários, não falta inclusive os que teorizam sobre o assunto, como o gerente de marca da plataforma Revcontent (sediada na Flórida, Estados Unidos), Charlie Terenzio: “Em um mundo onde todos estão limitados pelas regras do Facebook e do Google, nós acreditamos que a ‘internet aberta’ é a base para a liberdade de expressão — nossa rede é focada no usuário e empodera tanto publishers quanto anunciantes para alcançar a audiência certa na hora certa”.

Personalizar a experiência de consumo

Luiz Biagiotti, country manager da Outbrain no Brasil, esclarece que os temas relacionados no espaço Recomendadas para você não aparecem de forma randômica. “Temos 60 algoritmos que envolvem customização, filtros colaborativos, enfim, um conjunto de técnicas que personalizam a experiência de consumo de conteúdo na internet”, explica. A recomendação desses conteúdos é orgânica e utiliza o próprio inventário do veículo para posicionar essas informações. Essas manchetes relacionadas à notícia clicada vão dividir espaço com outros links, que serão conteúdos de outros veículos, marcas, promoções, hotsites, divulgações de assessoria de imprensa, por exemplo.

 

Os principais players do mercado exigem algum tráfego mínimo e relevância para disponibilizar os espaços de recomendação”

A Outbrain é remunerada por isso e, de acordo com os cliques nesses itens patrocinados, o publisher também recebe uma receita. “A proporção do número de links patrocinados para os orgânicos é uma decisão do publisher: se ele busca mais engajamento, recomendamos mais notícias do próprio veículo; se deseja gerar mais receita, aumenta o número de conteúdo de terceiros”, ressalta Biagiotti.

Uma notícia de esporte, por exemplo, não pode ser recomendada por muito tempo. O resultado de um jogo do final de semana tem “prazo de validade” muito curto. Esse tipo de definição parte do contato direto entre a Outbrain e um braço editorial do cliente.

“Em um site como o da FSP, o editor pode não aceitar que uma manchete de celebridades esteja relacionada ao noticiário policial”, exemplifica Biagiotti sobre forma de ajustes que podem ser predefinidos. Outra situação é a possibilidade, ainda na mesma hipótese, de a plataforma recomendar uma notícia de outro veículo concorrente.

A Outbrain, em junho, comprou a AdNgin, empresa de otimização de interface do usuário, criada com intuito de melhorar a experiência dos leitores. Para Yaron Galai, fundador da Outbrain, “investir na AdNgin é um passo em direção a uma experiência melhor de leitura”. Segundo o CEO, combinar as tecnologias das duas plataformas proporciona um desempenho melhor para todas as partes: “Os publishers alcançam RPMs (receita por mil impressões) mais altos; para os anunciantes, a taxa de cliques (CTRs) aumenta; e permite aos leitores uma melhor interação com o conteúdo. Essa junção nos ajudará a focar nossa jornada de conteúdo personalizado”.

“O cliente possui um dashboard (painel de controle) onde ele pode definir endereços e palavras-chave que não quer que apareçam em sua página – e isso é algo dinâmico, que ainda recebe o suporte da empresa para esses ajustes”, pontua.

Como relata a coordenadora de parcerias da Folha de S. Paulo, Ana Paula Ferreira, para delimitar os conteúdos, foi desenvolvido um trabalho “a quatro mãos” entre redação e área comercial. “A Redação ajustou e homologou todo o conteúdo das recomendações orgânicas, que mexem diretamente com os princípios editoriais do jornal”, cita. Para as pagas, a área comercial delimitou temas que não poderiam ser abordados e, diariamente, é feito um trabalho de controle e bloqueio das recomendações que fogem à política da publicação. “Além desse controle, caso haja alguma campanha que seja mais sensível à Folha, o account manager da Outbrain consulta se ela pode ou não veicular”, confirma.

A equipe dos account managers é a responsável pelo filtro constante de todos os conteúdos na relação entre anunciantes e editores, com foco no que será entregue à audiência. Para Biagiotti, a “garantia é de que o leitor vai ter a qualidade na recomendação e, para os principais publishers do Brasil, isso é tão importante quanto a receita”.

Em anúncio recente, a Outbrain renovou e expandiu contrato com sites da Infoglobo, Valor Econômico, Editora Globo e Edições Globo Condé Nast. A parceria soma mais de 600 milhões de pageviews mensais e vai até 2019. Entre os 19 sites envolvidos, estão O Globo, Extra, Época, Autoesporte, Quem, Marie Claire, Glamour, Vogue, GQ e o jornal Valor Econômico. Além de construir engajamento com a recomendação de artigos, a proposta deve ampliar a distribuição da produção do estúdio de branded content do grupo, o G.LAB.

Tiago Afonso, diretor de desenvolvimento comercial e digital da Infoglobo, Editora Globo e Valor Econômico, afirma que o foco está no desempenho: “Produzimos conteúdos que atraem dezenas de milhões de consumidores todos os meses e queremos contar com tecnologias que nos permitam aumentar o aproveitamento desse usuário dentro dos nossos sites e que ajudem nas nossas estratégias de distribuição de conteúdo para marcas parceiras”.

Publico de qualidade

E as marcas, o que ganham com esse tipo de interação? Links extremamente qualificados, respondem os profissionais por trás dessas ferramentas. O produto do anunciante aparece vinculado às reportagens dos principais sites do mundo, onde os espaços publicitários são bastante disputados.

“Você paga para promover seu conteúdo em sites editoriais confiáveis e, em troca do seu investimento, ganha acesso ao público do publisher, podendo mesclar seu conteúdo à experiência do usuário do site”, resume em um artigo institucional o CEO e fundador da Taboola, Adam Singolda.

Os anunciantes pagam um determinado valor toda vez que um anúncio é clicado. Biagiotti, da Outbrain, reforça que o sistema de recomendação de links possibilita “trackear” vários momentos na experiência de compra, em que é possível acompanhar as métricas dos usuários em todas as etapas do funil de vendas. “As marcas também possuem um painel de controle onde vão acompanhar o número de cliques — o custo por aquisição (CPA) — sendo possível customizar cada etapa do processo”, garante.

Singolda, da Taboola, alerta que os conteúdos dos links devem ser produzidos com integridade jornalística, “claramente identificados como patrocinado”, e restritos a uma área de anúncios. “Se os usuários não confiarem no seu conteúdo ou o acharem irrelevante, eles vão considerá-lo como propaganda e ignorá-lo”, afirma.

Taboola e Outbrain são dois dos principais players mundiais no segmento de recomendação de conteúdo. Ambos foram fundados em Israel, mas hoje têm sede em Nova York, nos Estados Unidos, e operações em diversos países. Em 2017, o site israelense Calcalist revelou que uma possível fusão entre as empresas “estaria em estágio avançado de negociação”. O assunto causou repercussão no mercado, porém não foi confirmado nem se concretizou.

Publicidade e conteúdo

Existe uma variedade de outras empresas no mercado que oferecem a possibilidade de recomendar conteúdo e gerar receita. Uma delas é a Revcontent, que, nas palavras do gerente de marcas, Charlie Terenzio, atende “tanto ao publisher, que tem tráfego no site e precisa monetizar, além de engajar melhor sua audiência, quanto às marcas e negócios que precisam de exposição privilegiada”.

A empresa oferece espaços responsivos, scroll infinito (conteúdos que aparecem conforme a tela é movimentada para baixo) e galerias, dentre outras customizações para que os sites consigam renda da melhor maneira possível. “Os veículos também podem tirar vantagem dos analytics da Revcontent e do sistema de relatórios com estatísticas em tempo real da performance do seu site”, acrescenta Terenzio.

Já a empresa WorldSense desenvolveu uma plataforma que pretende, a partir das histórias contadas pelos grandes portais do país, unir tecnologia e conexão com anunciantes. “Aproveitamos as reportagens e matérias que tenham a ver com as marcas para posicioná-las, através de diferentes formatos, como autoridade naquele assunto. Isso traz mais visibilidade e novos usuários, gera consideração de marca e, de quebra, auxilia a distribuir seu conteúdo”, pontua o cofundador da WorldSense, Diego Nogueira.

Um dos formatos previstos pela plataforma é a inserção de “conteúdo de qualidade” integrado com o assunto da matéria. Por exemplo, uma reportagem da revista Exame sobre a indústria 4.0 é relacionada a um artigo desse assunto, sob a expertise da anunciante TOTVS.

“A ferramenta permite às marcas participarem das histórias e, por se posicionar em veículos de alta qualidade, atingem uma nova audiência, engajada e altamente qualificada”, acrescenta Nogueira. Publishers como o IDG Now!, a revista Cláudia e o site Tecmundo associam conteúdos patrocinados utilizando a tecnologia da WorldSense.

Retorno financeiro

Na outra ponta, quem aproveita a leitura qualificada para divulgar suas mensagens por meio da WorldSense são nomes como IBM, a SondaIT, Avon e Mongeral Aegon, além da interface com agências de publicidade como a F.biz e Ogilvy.

A sede brasileira da auditoria e consultoria comercial Deloitte também fez uso da tecnologia para dar visibilidade à 56ª edição da revista Mundo Corporativo, uma publicação direcionada a profissionais atendidos pela empresa. Esse material foi vinculado a cerca de 100 artigos em publicações relevantes de todo o Brasil e rendeu, como resultado, mais de 200 mil interessados e mais de 50 horas de leitura do material publicado.

De acordo com o diretor de comunicação e marca, Renato Souza, “a Deloitte tem como compromisso compartilhar conteúdos relevantes com tomadores de decisão e formadores de opinião do mercado e, por isso, valoriza soluções para ampliar o potencial de alcance junto a audiências qualificadas no meio digital”.

A remuneração dos publishers, que cedem o espaço para que os serviços de recomendação disponibilizem para anunciantes, acontece quando os usuários clicam nesses links. As empresas ouvidas não divulgam números sobre remuneração, alegando políticas internas.

“O modelo predominante de cobrança é o custo por mil (CPM), que cobra a cada mil visualizações dos anúncios – e os nossos publishers devem esperar uma remuneração relativa alta para essas ações”, explica Nogueira, da WorldSense. Já Terenzio pontua: “A Revcontent é uma rede que utiliza o custo por clique (CPC) e nos associamos com publishers para ajudar a monetizar o seu site e crescer sua audiência”.

Integrar uma plataforma de descoberta de conteúdos nas páginas do site do publisher, no entanto, nem sempre é uma oportunidade para todos os veículos. Apesar de se desenvolverem em ambiente digital, essas empresas estabelecem contato com os interessados por meio de suas equipes de atendimento (geralmente por meio de seus canais oficiais).

Os principais players do mercado exigem algum tráfego mínimo e relevância para disponibilizar os espaços de recomendação. “Para garantir a qualidade da parceria, a Outbrain procura ter ao menos um milhão de impressões para estabelecer o serviço – no entanto, analisamos cada caso”, explica o country manager Biagiotti.

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