Marco Civil da internet completa 11 anos e é desafiado pelas redes sociais

Redes sociais e inteligência artificial seguem sem regulamentação e desafiam neutralidade das redes

Quando foi sancionado, em 23 de abril de 2014, pela presidente Dilma Rousset, um dia após sua aprovação pelo Senado, o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) foi reconhecido como uma legislação inovadora e referência internacional. A lei foi pioneira em tratar da neutralidade de redes e da proteção da privacidade e de dados pessoais. Além disso, buscou-se estabelecer o direito ao exercício da cidadania nos meios digitais, além da diversidade e da liberdade de expressão na internet.

Aprovação, pelo Senado, do Marco Civil da Internet, em 2014 (foto: Moreira Mariz, Agência Senado)

Passados 11 anos, a liberdade de expressão na internet é confundida pelas empresas de redes sociais como liberdade de atacar a democracia, que ainda remuneram canais que vivem de enganar o público e incentivar todo o tipo de ódio político, religioso e social, divulgando fake news. Essa é a parte dark das redes, mas a parte de proteção de dados, por exemplo avançou, graças a outra lei, mesmo com delinquentes digitais roubando e se apropriando de dados. Mas existe agora lei para combater essa prática. Falta a polícia e a Justiça fazer suas partes.

Quatro anos depois do Marco Civil da Internet surgiu outra legislação avançada e pertinente. A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 38.709, de 2018).

No Congresso, tramita o chamado projeto de lei das fake news (PL 2.630/2020), que trata do combate à disseminação de notícias falsas e regula a atuação das chamadas big techs, empresas responsáveis pelas plataformas digitais. O texto, do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), foi aprovado pelo Senado em 2020, com relatório do senador Angelo Coronel (PSD-BA). A proposta, que responsabiliza as big techs pela disseminação de conteúdos por meio de seus algoritmos, enfrentou resistência na Câmara dos Deputados, onde tramita agora. Sem consenso para votação, o projeto deve ser tema de um grupo de trabalho.

o Senado, o PL 113/2020 amplia essa autorização e permite que o Ministério Público e delegados de polícia solicitem os registros de conexão na internet sem autorização judicial prévia.

Conforme previsto no artigo 19, os provedores de internet só podem ser responsabilizados pelo conteúdo gerado no meio digital quando não cumprirem ordem judicial sobre a remoção de conteúdos considerados infringentes. O objetivo desse trecho da lei é “assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura”. A constitucionalidade desse artigo, entretanto, está sendo analisada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que ainda julgará o tema. O relator é o ministro Dias Toffoli.

Um projeto sobre o assunto, do senado Jorge Seif (PL-SC), cria novas regras para a moderação de conteúdos nas redes sociais e dificulta a remoção de publicações ou a suspensão de contas (PL 592/2023), algo que vai na contramão do sentido democrático da rede e atende aos interesses pouco confessos das big techs. De acordo com Seif, o projeto retoma em grande parte a Medida Provisória (MP) 1.068/2021, que, editada pelo então presidente da República, Jair Bolsonaro, que ajudou e foi ajudado pelas big techs na proliferação de mentiras políticas, foi devolvida ao Executivo pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, por considerá-la inconstitucional. Aprovada na Comissão de Comunicação e Direito Digital (CCDD) com relatório favorável do senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), partidário de Bolsonaro, a proposta seguiu em análise na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) e permanece engavetada.

Elaborado por uma comissão de juristas do Senado, o anteprojeto de reforma do Código Civil, apresentado em 17 de abril, estabelece mudanças no Marco Civil da Internet, entre elas a revogação do artigo 19. O texto ainda tramitará nas comissões temáticas da Casa.

IA

Também está sendo analisado pelos senadores um marco regulatório da inteligência artificial no Brasil. O PL 2.338/2023 foi apresentado pelo presidente da Casa, tendo base no anteprojeto elaborado pela comissão especial de juristas que funcionou em 2022 com esse propósito. O texto tramita junto de outros sobre o mesmo tema. Posteriormente, outra comissão, essa de senadores, se encarregou de discutir a IA. Em abril do ano passado, o senador Eduardo Gomes (PL-TO) apresentou o seu relatório preliminar, um texto substitutivo sobre a proposta na Comissão Temporária Interna sobre Inteligência Artificial no Brasil (CTIA).

O avanço da inteligência artificial ganhou destaque especialmente no fim de 2022, com a chegada de recursos como o ChatGPT, um sistema de IA capaz de produzir textos. Impulsionado pelas redes sociais, o uso da IA preocupa autoridades, em especial durante o período eleitoral, em que a polarização incentiva a propagação da desinformação e discursos de ódio.

Novidades da regulação das redes

O Conselho de Comunicação Social (CCS) do Congresso Nacional promoveu nesta segunda-feira (7) debate sobre a regulação das redes sociais e como essa legislação deveria ser implementada — em um cenário no qual, além de promover interações e entretenimento, as plataformas se integram à economia contemporânea.  O presidente do CCS, Miguel Matos, afirmou que “as redes sociais, que outrora pareciam meros instrumentos de interação e lazer, tornaram-se protagonistas de uma profunda reconfiguração do espaço público, da política e da cultura. Manuel Castells nos lembra que o poder é cada vez mais exercido por meio da construção simbólica de significados na mente das pessoas. E é precisamente esse campo de batalha onde operam hoje as plataformas digitais: a disputa pela atenção, pela verdade e, por vezes, pela própria realidade. É nesse contexto que emerge a complexa tarefa de pensar a regulação das redes sociais”.

Para o presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Carlos Baigorri, a questão pode ser dividida entre os próprios usuários e o modelo econômico das plataformas de redes sociais. Segundo ele, o que era no começo um ambiente de troca de informações acabou se tornando um ambiente propenso ao discurso de ódio, ao bullying e a toda uma série de questões que precisam ser abordadas. Baigorri destacou que hoje, no ambiente digital, “o anonimato não é uma exceção; o anonimato [ainda] é a regra” para essas formas de agressão.

Para a coordenadora do Comitê Gestor da Internet no Brasil, Renata Mielli, o artigo 19 do Marco Civil da Internet permanece importante e eficaz para um determinado tipo de provedores de aplicação, mas é insuficiente e ineficaz para outros. Segundo ela, para fazer essa distinção, é preciso olhar o tipo de intervenção, o tipo de funcionalidade que o provedor de aplicação tem e definir se ele interfere na circulação do conteúdo desse usuário ou não.

Pesquisador do Centro de Pesquisa em Ciência, Tecnologia e Sociedade do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Tulio Chiarini afirmou que as plataformas não são neutras, já que decidem, com base em algoritmos, o que cada pessoa vai ver ou deixar de ver. Também disse que as plataformas coletam e usam os dados em tempo real, e que elas atuam sobre o modelo de negócios, baseado em vigilância, atenção e engajamento. Ou seja, segundo ele, as empresas ganham dinheiro com o tempo que o usuário passa diante da tela e, quanto mais se usa a plataforma, mais valiosa ela se torna.

Dados mais recentes da pesquisa TIC Domicílios apontam que 81% dos usuários da internet usam as redes sociais (para comunicação, entretenimento ou uso como canais de venda). De acordo com esse levantamento, pelo menos 22% dos usuários de internet usaram as redes sociais para compras. Nesse estudo, 89% das empresas do universo pesquisado têm perfil nas redes sociais.

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