Nada do que comunicamos faz sentido se não soubermos incluir o outro na conversa. Em organizações com milhares de funcionários e necessidades diversas, uma comunicação interna que exclui determinados grupos do fluxo diário de informações pode ter impactos desastrosos na cultura organizacional. Já dizia o ditado: conhecimento é poder – e para o colaborador, a falta de informação significa agir sem propósito. Portanto, não surpreende que a inclusão tenha se tornado um elemento fundamental nas estratégias de comunicação.
Mas inclusão não tem só a ver com o simples acesso à informação; trata-se de promover uma comunicação interna verdadeiramente inclusiva, que elimine qualquer ruído que possa prejudicar a compreensão da mensagem. É neste ponto que a acessibilidade assume um papel crucial no diálogo com o colaborador: ao celebrar a diversidade de experiências, ela garante que todas as vozes sejam ouvidas, sem distinções.
Compromisso firmado
Uma comunicação interna inclusiva e, acima de tudo, acessível requer o reconhecimento de que cada colaborador possui suas singularidades. Na prática, ao olhar mais atentamente às necessidades e vivências das pessoas com deficiência, as organizações se tornam capazes de eliminar potenciais entraves na comunicação.
Isso significa assegurar que colaboradores com diferentes tipos de deficiência não apenas recebam a mensagem da empresa, mas também a compreendam plenamente. Bianca Franchini, gerente de Reputação Corporativa do Sicredi, resume bem o papel da comunicação interna nesse sentido: “ela deve ser usada intencionalmente para reduzir os obstáculos que dificultam ou impedem o acesso das pessoas à informação”.
As barreiras ficam ainda menores quando a comunicação acolhe o público interno com empatia, sem segmentá-lo de acordo com suas necessidades. Segundo Bianca, uma comunicação personalizada, empática e em diferentes formas é o melhor caminho, ao passo que, em sua visão, a segmentação não é um meio de inclusão, mas sim de exclusão. “O primeiro passo para torná-la eficaz é entender que não é um limite individual que determina a situação de deficiência de uma pessoa, e sim as barreiras existentes nos espaços, na informação ou nas relações interpessoais.”
Comunicação interna inclusiva é cultural
Entretanto, para que acessibilidade seja mais do que apenas um discurso, é fundamental que existam políticas, diretrizes e metas claras que reforcem o comprometimento da empresa com a inclusão – inclusive no que diz respeito à comunicação interna. É o que aponta Josiane Lima, diretora de Talentos do Grupo SBF, responsável pelas marcas Centauro, Fisia (distribuidora da Nike Brasil), NWB, OneFan X3M, FitDance e Studio 78. “Esses três pilares, se bem definidos, servem como alicerces que validam a cultura e os valores da organização em torno da acessibilidade”, complementa.
Quando a inclusão se torna um pilar da cultura organizacional, tudo passa a ser criado e desenvolvido sob o aspecto inclusivo. E na comunicação interna isso não é diferente. Nesse sentido, Josiane afirma que é preciso tornar a diversidade uma estratégia da área, garantindo que todo e qualquer produto de comunicação seja genuinamente acessível a todos. O resultado desses esforços, segundo ela, são lideranças mais comprometidas com o tema, recursos financeiros apropriados e acesso à tecnologia e infraestrutura. “Ao fortalecer esses pilares, a comunicação interna inclusiva se torna mais do que uma simples iniciativa; ela se transforma em um elemento fundamental da cultura”, crava a executiva.
Para avançar nessa direção, o primeiro passo da jornada inclusiva é envolver ativamente as pessoas com deficiência nas iniciativas e conteúdos internos. A diretora de Talentos do Grupo SBF acredita que é por meio dessa troca que a empresa pode aprimorar seus eventos e a própria comunicação interna, tornando-os verdadeiramente inclusivos. “Devemos estar vigilantes e prontos para reconhecer e adaptar as mensagens de acordo com as necessidades de nossos colaboradores”, pontua. Além disso, para gerar identificação e representatividade, é fundamental que todas as representações visuais reflitam a diversidade de histórias e experiências dos colaboradores.
Construindo uma comunicação interna mais inclusiva
Embora a inclusão seja a essência de uma comunicação acolhedora, ainda é desafiador instigar nas pessoas um compromisso mais profundo com o tema. Na opinião de Bianca Franchini, do Sicredi, o desafio começa pela resiliência. Para superar esse obstáculo, ela acredita ser importante mapear a rede de apoio, identificando quem são os aliados da pauta e reforçando o vínculo com a estratégia da empresa. “É preciso ter intenção e consistência nas iniciativas. Cultivar um ambiente onde todos se sintam respeitados e valorizados requer tanto ações voltadas a uma cultura inclusiva quanto atitudes individuais de cada colaborador”, ressalta a gerente de Reputação Corporativa da empresa.
Contudo, um ambiente inclusivo e acolhedor não surge por mero acaso; precisa ser construído tijolo a tijolo, como destaca o especialista em Diversidade & Inclusão da Volkswagen do Brasil, Guilherme Nascimento. Segundo ele, essa construção envolve cinco pilares essenciais: coragem, competência, compromisso, constância e coerência. A coragem é necessária para “fazer o que nunca foi feito” e superar o medo de se posicionar. Já a competência é um requisito básico para os profissionais de comunicação e representa o conhecimento sobre aquilo que comunicamos. O compromisso, por sua vez, envolve a criação de um plano de comunicação interna sólido e inclusivo que envolva e engaje a audiência.
Na sequência, entra em jogo a constância ao abordar a inclusão: não adianta, por exemplo, falar da pauta LGBTQIAPN+ apenas em junho ou do enfrentamento ao racismo somente em novembro. “A diversidade existe todos os dias, então um plano de comunicação atrelado à estratégia de Diversidade & Inclusão do negócio é fundamental, e a proximidade entre os time de D&I e Comunicação Interna faz toda a diferença”, explica Guilherme. Por fim, é essencial atuar com coerência para gerar mudanças a longo prazo. “É fazer desse tema um propósito e não uma nova onda.”
Conexão com a pauta
A especialista em Comunicação Interna da Volks, Heloísa Sassaki, aprofunda a reflexão, reforçando a importância de se investir na qualificação das equipes de comunicação interna. Independentemente de quais sejam os desafios relacionados à pauta inclusiva, é essencial que os profissionais que atuam como intermediários entre os colaboradores e a organização estejam engajados no tema e dispostos a ampliar seus conhecimentos e perspectivas. “Por meio de capacitação, conexão com a estratégia de diversidade, novas formas de acessar públicos da operação e investimentos em recursos de acessibilidade, acredito que podemos fomentar ainda mais esta pauta dentro e fora do meio empresarial”, reflete.
Também não é por acaso que a comunicação interna seja um dos principais agentes de propagação das temáticas associadas à área de Diversidade & Inclusão na Volkswagen do Brasil. Guilherme Nascimento é enfático nesse ponto ao destacar que, sem ela, “a estratégia de DEI seria apenas um sonho no papel”.
Na prática, os temas-chave são fomentados durante o ano todo por meio de pílulas de comunicação planejadas cuidadosamente para cultivar o tão indispensável comprometimento. Além disso, esforços adicionais em parceria com o time de Marketing fortalecem ainda mais a estratégia com o objetivo de promover a agenda inclusiva para além da organização. Guilherme exemplifica a iniciativa citando campanhas de comunicação, parcerias com influenciadores digitais e conteúdos impulsionados pelos Top Voices da marca no LinkedIn.
Consciência e altruísmo
Porém, para que a acessibilidade se torne um compromisso compartilhado por todos, ela precisa estar incorporada a uma comunicação interna inclusiva que inspire uma mudança genuína de mentalidade. Segundo o especialista em Diversidade & Inclusão da Volks, essa virada de chave implica em comunicar e capacitar os colaboradores para que compreendam os vieses relacionados às pessoas com deficiência. Na empresa, esse entendimento é estimulado por meio de campanhas de conscientização sobre os tipos de deficiência, casos pessoais, webinars e cartilhas de apoio.
Para Patrícia Molino, líder de Diversidade da KPMG, organização global especializada na prestação de serviços profissionais, a quebra de paradigmas acontece quando passamos a pensar de forma altruísta em relação à acessibilidade das pessoas com deficiência.
Através de lembretes regulares, a executiva acredita que é possível envolver os colaboradores de forma mais natural nessa missão. “Às vezes, no cotidiano, as pessoas sem deficiência não refletem sobre seus acessos e privilégios, e precisamos conscientizá-las para que se engajem pelo fim do capacitismo e da discriminação.”
A prática inclusiva
Entretanto, sem a implementação de ações que simplifiquem a vida do profissional com deficiência, nenhuma estratégia será capaz de o incluir nas discussões internas. Com o uso da tecnologia e uma dose considerável de sensibilidade, é possível comunicar para todos sem estigmatizar determinados grupos ou pessoas. Como bem ressalta Patrícia Molino, a acessibilidade deve existir no dia a dia por meio de ações práticas que garantam a participação plena de todos os membros da equipe, independentemente de suas necessidades.
Disponibilização de legendas em vídeos, presença de intérpretes de Libras em eventos, tradução simultânea e automática, audiodescrição para pessoas com deficiência visual e suporte a aplicativos de leitura são alguns exemplos de como as empresas praticam a inclusão. Bianca Franchini, gerente de Reputação Corporativa do Sicredi, também acrescenta ao rol de recursos inclusivos a adoção de textos alternativos nos conteúdos internos, a adaptação do contraste para melhorar a visibilidade e a atenção aos aspectos do layout nas peças de comunicação.
Já no que diz respeito ao conteúdo, Heloísa Sassaki, especialista em Comunicação Interna da Volkswagen do Brasil, ressalta a necessidade de evitar o uso de imagens ou símbolos que possam reforçar preconceitos, termos de duplo sentido, figuras de linguagem e trocadilhos, especialmente quando o público-alvo inclui pessoas dentro do espectro autista. Ou seja, a mensagem deve ser elaborada de forma clara, sem qualquer ambiguidade. Ao seguir à risca essas diretrizes, a equipe de comunicação interna terá um impacto positivo sobre as demais áreas da empresa, contribuindo para a construção de uma cultura mais inclusiva. “Vale também utilizar recursos como a representatividade, ilustrando e entrevistando pessoas de diversas unidades, para criar essa conexão com os colegas”, complementa Heloísa.
Incluir também é ouvir
Além dos recursos práticos, a cultura do feedback é um importante componente nessa estratégia. Ao encorajar os colaboradores com deficiência a compartilhar suas necessidades de forma aberta e confiante, as organizações têm a chance de analisar suas experiências de forma mais individualizada e, a partir daí, promover melhorias em sua comunicação.
Josiane Lima, diretora de Talentos do Grupo SBF, enfatiza que, embora a tecnologia sempre evolua em prol da acessibilidade, o aspecto mais crucial da inclusão é a prática da escuta empática. “É somente por meio dela que podemos verdadeiramente compreender as necessidades individuais e, assim, conceber soluções genuinamente inclusivas”, destaca. A comunicação interna, nesse sentido, só tem a ganhar.
Nesse contexto de diálogo, a organização realiza pesquisas regulares para avaliar como seus colaboradores se sentem e percebem o ambiente de trabalho em relação à inclusão. Além disso, também são oferecidos treinamentos para combater vieses inconscientes durante os processos de avaliação de desempenho. Segundo Josiane, implementar processos de melhoria contínua que ofereçam um espaço seguro para os colaboradores se expressarem é essencial nesse processo. Da mesma forma, estabelecer processos de feedback estruturados é igualmente importante para garantir que suas preocupações sejam tratadas de maneira eficaz.
O poder do feedback na comunicação inclusiva
Quando o objetivo é incluir, ouvir com atenção e interesse também faz parte da conversa. Na KPMG, por exemplo, a condução de entrevistas individuais com pessoas com deficiência é uma prática comum e muito valiosa sob o ponto de vista da inclusão. Foi assim que a empresa criou um canal exclusivo e adaptado para atender a uma necessidade específica, como bem explica Patrícia Molino. “Por meio desse processo, nós identificamos, por exemplo, que nossos profissionais com deficiência auditiva não poderiam ou teriam dificuldade em acessar por voz o atendimento de suporte de informática”, conta Patrícia.
Não é por acaso que a escuta-ativa abre caminhos para uma compreensão mais profunda sobre as necessidades e os desafios específicos de cada colaborador. A consultora de Cultura e Gestão de Mudanças na KPMG, Gabriela Laceranza, convive com a esclerose múltipla e compreende de forma muito pessoal a importância de construir essa relação de confiança. Nesse contexto, empatia e abertura emergem como elementos essenciais para uma comunicação interna mais acessível, adaptável e objetiva. Mas não é só isso. Ela acredita que, quando a comunicação é única e inclusiva, as pessoas se sentem mais acolhidas e respeitadas, independentemente de suas diferenças.
Consciente disso, Gabriela enfatiza a importância da linguagem nesse processo de troca. “Todas as interações e conceitos que conhecemos são descritos e transmitidos pela linguagem. Assim, ser intencional é muito importante para fazer a diferença.” O resultado é uma comunicação que comunica para todos, sem separação de pessoas por suas características. “Explicar por que fazemos o que fazemos é tão importante quanto fazer”, conclui a colaboradora.
Lideranças que fazem a diferença
A liderança é a melhor e mais poderosa arma da comunicação interna para estreitar os laços com os colaboradores. Nas palavras de Josiane Lima, diretora de Talentos do Grupo SBF, ter líderes que compreendam e valorizem a voz dos funcionários é fundamental para promover a inclusão. “Eles devem escutar com empatia, buscando soluções para situações adversas apresentadas por seus colaboradores”, explica. Essa abordagem, segundo ela, cria um ambiente altamente inclusivo, onde a confiança pode ser percebida por todos.
Bianca Franchini, gerente de Reputação Corporativa do Sicredi, complementa a ideia ao destacar a importância de capacitar as lideranças para que “tenham plena consciência do papel crucial” que desempenham na empresa. Com isto em vista, a Volkswagen do Brasil fornece a seus líderes uma cartilha de “Regras de Ouro” voltada aos processos de recrutamento e seleção. O objetivo, conforme enfatizado por Guilherme Nascimento, especialista em Diversidade & Inclusão, é oferecer exemplos concretos do que evitar dizer, questionar ou como não se comportar durante um processo seletivo. “Nesse cenário, atuar com as lideranças é fundamental; e a capacitação contínua, uma necessidade constante”
Já Patrícia Molino, da KPMG, alerta que, na ausência de líderes engajados que sirvam de exemplo ou de uma liderança diversa que inclua pessoas com deficiência, as mudanças ficarão restritas ao campo das palavras. A verdadeira transformação vem com representatividade, engajamento para romper preconceitos e uma comunicação que abrace a todos. É assim que se faz.
Comunicação interna inclusiva: informações relevantes
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