Rita Lee foi a mais importante roqueira brasileira. E a mais original. Faleceu aos 75 anos nesta segunda-feira (8), depois de uma luta contra o câncer de pulmão desde 2021. Vamos publicar mais adiante um estudo bem pertinente agora, publicado em 2018, TCC de conclusão de curso de Jornalismo na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (“Rita em 4 tempos”), feito por Ananda Zambi de Albuquerque, hoje mestra em Comunicação. A autora analisou quatro entrevistas significativas da cantora feita por grandes veículos de imprensa entre os anos 1971 e 2007, que abrange o período mais importante de sua carreira: Revista Fatos e Fotos (“Rita, a garôta Lee”, 1971); Revista Nova (“Rita Lee: sexy, debochada, corajosa”, 1978; Jornal do Brasil (“Rita Lee trabalha em paz”,1990) ; e Revista Rolling Stone (“Não nasci para casar e lavar cuecas”, (2007). Rita deu dezenas de entrevistas para outros veículos impressos, rádio, TV e internet. Mas nesse resumo é possível analisar como a mídia a interpretava.
Rita Lee também foi profética do jornalismo em seu livro “Rita Lee: uma autobiografia”, de 2016 (Globo Livros, mais de 300 mil exemplares vendidos): escreveu: “Quando morrer, posso imaginar as palavras de carinho de quem me detesta. De certa forma, a Folha de S. Paulo caiu na arapuca e publicou a manchete deselegante — mas não totalmente incorreta, desculpe fãs xiitas que agora se mostram conservadores e moralistas e pediram até a demissão da jornalista que escreveu — em sua chamada de primeira hora na mídia social: “Rita Lee, rebelde desde a infância, se deixou guiar por drogas e discos voadores.” Com a repercussão negativa do título por parte dos fãs, o jornal mudou rapidamente para “Drogas tiveram papel político na trajetória de Rita Lee, rebelde desde a infância”.
Rápida biografia
Mas antes disso, vamos a uma rápida biografia de Rita Lee. Se é que cabe um resumo num espaço curto, de uma vida e carreira musical tão intensas. Nasceu em São Paulo em 31 de dezembro de 1947. Seu pai, Charles Jones era dentista e filho de imigrantes norte-americanos. Sua mãe, Romilda Padula, italiana, pianista, incentivou a filha a entrar na carreira musical. De forma careta claro, fazia apresentações com amigas em casas de família. Foi descoberta pelo cantor e produtor Tony Campello e chamou ela e suas amigas para serem back vocais.
Em 1964 entrou para o mundo do rock com o grupo Six Sided Rockers, base de formação do famoso Mutantes, grupo que ajudou a fundar em 1966, após desistir de cursar a faculdade de Comunicação e onde ela deslanchou, participou de experimentações musicais psicodélicas, e ficou famosa, entre 1966 e 1972. Brigou com o Mutantes, rompeu um relacionamento com Arnaldo Batista, também membro da banda, e foi para a carreira solo. Foi um sucesso atrás de outro.
Encontrou um rock mais bem comportado nas músicas, não nas letras, em 1979, já em parceria com seu companheiro e futuro marido Roberto de Carvalho, com “Mania de Você”, e posteriormente com “Chega Mais” e “Doce Vampiro”. No ano seguinte, mais sucessos: “Lança Perfume” e “Baila Comigo”. Abordou temas moralisticamente polêmicos na época, como a sexualidade feminina e as drogas.
Em 1966 teve um acidente em seu sítio e quebrou o maxilar. A recuperação foi lenta. Estava envolvida com drogas e álcool e confessou ao Fantástico, que só conseguiu se livrar mesmo do vício em 2006. Ganhou vários prêmios. Em 2012 anunciou que não iria fazer mais shows, mas chegou a fazer mais dois até 2013. Seu ultimo álbum, com músicas de estúdio e inéditas, o “Reza” foi lançado em 2012. Ao todo foram 40 álbuns, sendo 6 dos Mutantes, 34 na carreira solo.
A revista Rolling Stone Brasil divulgou, em 2008, uma lista com os 100 maiores artistas nacionais de todos os tempos, e colocou Rita em 15º lugar. Segundo a Associação Brasileira de Produtores de Discos (ABPD), ela é a terceira artista que mais vendeu discos no Brasil e a primeira mulher no ranking, alcançando a marca de 55 milhões de cópias vendidas em 50 anos de carreira. Segundo levantamento do governo, ela também foi a artista mais vetada na ditadura militar, com 14 músicas censuradas.
Amanda complementa fatos biográficos da artistas: No auge de sua carreira Rita foi presa por porte de maconha, em 1976 e estava grávida. Segundo críticos musicais, foi uma prisão moral, motivada pelas músicas que tinham letras com palavrões, erotismos e uso de drogas. A cantora ficou um ano em prisão domiciliar, precisando de autorização para ir fazer os shows. Foi nessa época que Rita Lee começou a fazer shows em ginásios e estádios e a ganhar discos de ouro e de platina.
O jornalista Okky de Souza, em reportagem realizada em 1983 para a revista Veja, afirmou que Rita Lee “abrasileirou” o rock: “Ela conferiu, ao ritmo importado, uma matreirice nas letras, um sentido de paródia e de
deboche que tem raízes fundas no gosto popular brasileiro.
Para o compositor pernambucano João Falcão, no programa Arquivo N3, exibido em 2009 no canal Globo News, Rita “trouxe uma coisa cosmopolita, moderna, divertida, cheia de humor” para a música nacional, que “chegou para bagunçar um pouco a festa da MPB”. Agora caseira, com cabelos grisalhos, sóbria e defensora dos direitos dos animais, a artista está reclusa e jura que não vai mais pisar nos palcos. Segundo Rita, ela está enfrentando um dos maiores desafios de sua vida: envelhecer e ser uma pessoa normal.
Ah, em seu epitáfio, pediu, em sua autobiografia (que será atualizada agora), que deveria ser: “Ela não foi um bom exemplo, mas era gente boa”. Não tenho notícia se a família vai cumprir o pedido. À checar.
Bom, falta espaço para publicarmos o excelente trabalho de Ananda de Albuquerque com a análise daqueles quatro maravilhosos perfis, com fotos, de Rita Lee. Quem tiver interesse leia no link.
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