Por: João Marcos Rainho
O Dia da Mentira é um evento internacional. Nada como celebrar essa importante efeméride, pois está presente no dia a dia de todos nós. Quem nunca contou uma mentirinha? Existem várias versões sobre a origem da data, e uma das mais aceitas é que está relacionada à mudança do calendário Juliano para o Gregoriano, nos século XVI, na França. Isso não é bem uma mentira, mas uma convenção humana. Mas a comemoração anual pegou. O brasileiro, sempre criativo no ramo, associou o Dia da Mentira em 1828, quando surgiu o jornal mineiro A Mentira. Na sua primeira edição, trazia a fake news da morte de Dom Pedro 1º, na capa. Publicado justamente num 1º de abril. Causou tremendo impacto e dizem que até hoje tem gente que acredita nisso.
Nestes tempos de fake news, todo dia é dia da mentira. Pelo menos para quem acredita nelas por conveniência. O dia deixou de ser uma brincadeira para aludir a um poderoso instrumento político de controle das massas.
E temos vários exemplos de mentiras que a imprensa engoliu em parte ou totalmente, ou por algum tempo. Mentiras ligadas à política são as mais comuns. A morte de Tancredo Neves foi uma delas, não a morte em si, mas sua doença, em estágio terminal, que foi escondida do grande público por seus assessores até quando puderam. Tem a entrevista clássica de Tancredo dizendo que estava tudo bem, pouco antes de falecer, e a atrás dele, asseclas, escondiam os tubos invasivos. Procurem a foto na internet.
Não vamos nem falar do caso recente do governo Jair Bolsonaro, que aí é covardia. E não teremos espaço aqui para tanta desinformação oficial gerado pelo gabinete do ódio e a indústria das fakes financiadas por políticos e empresas. Que, por sinal, está sendo investigada. E que aliás, não pararam, porque os seguidores dessa seita estão aí alimentando fakes de todos os tipos e continuam os ataques às vacinas.
Reportagens inventadas
Um caso que causou grande repercussão foi o do repórter Jayson Blain, do The New York Times. Ele confessou, há pouco tempo que se arrependeu de ter mentido para o jornal há 20 anos. E após algumas inconsistência encontradas em suas matérias, o NYT fez uma investigação interna, que apontou “problemas” em 36 de seus 73 artigos escritos apenas em alguns meses anteriores à checagem. Ele plagiou e inventou diversos textos. Foi demitido em 2003. Hoje, Jayson Blain diz que “está limpo” e elogia o trabalho da imprensa, numa entrevista recente da Folha, que o encontrou no interior dos EUA. Entretanto, disse, no calor do escândalo, que o caso teve uma repercussão desmedida. E acusou o jornal, na época, de preconceito, por ser preto. Mas admite que tem transtorno bipolar e isso o levou às drogas. E daí, às mentiras, justificou. Chegou até a publicar um livro sobre o caso (Queimando a casa dos meus senhores – minha vida no New York Times), que não vendeu quase nada. Parece que quando ele mente, faz mais sucesso.
O NYT fez um tremendo “erramos” com o caso, e 2003, colocando a foto do jornalista na capa de uma de suas edições, e um texto que dizia: “A fabricação e o plágio generalizados representam uma profunda traição à confiança e um ponto baixo nos 152 anos de história do jornal”.
Mentiras totais e meias verdades
No Brasil, a criatividade pela mentira existe porque muita gente acredita nela, sem checar fatos. E existem agora ferramentas tecnológicas para manipular textos e fotos, e até biografias. Um caso notório por aqui foi do “fotógrafo” Eduardo Martins que conseguiu emplacar suas fotos de conflitos e guerras em diversas agências de notícias do mundo, as quais foram replicadas em importantes jornais, revisas e site. Se dizia fotógrafo da ONU, em 2017 e tinha mais de 100 mil seguidores no Instagram — onde postava fotos e grandes jornais do mundo, de outros autores, dizendo que era dele. Mas ele nunca existiu e parou somente quando foi desmascarado pela atenta jornalista Natasha Ribeiro, colaboradora da BBC Brasil, que vinha desconfiando do verdadeiro autor.
A checagem prévia ajudaria a descobrir farsas desse tipo ou até meias verdades. Hoje existem agências de checagem, mas que funcionam apenas no pós-mentira, quando a coisa já foi publicada. Por isso, um trabalho de pré-checagem salvou a reputação da Globo Filmes, por exemplo, que estava preparando uma série baseada na história da professora Jorana D´Arc Félix de Sousa, de 55 anos, pesquisadora premiada, a qual, contava uma história de sofrimentos e privações pessoais, sua infância triste, e que tudo teria sido superado, com seu esforço pessoal e culminou em um case de sucesso. Ela dizia que agora morava em Cambridge, na Inglaterra, e estudava na conceituada Harvard. A personagem existia, mas boa parte da história era falsa. Ela, que de fato tem uma história de superação, e participa em palestras, diz que não mentiu e que o curso em Harvard, ela começou mas não concluiu. Fontes de Harvard desmentiram. E a Globo já tinha escalado a atriz Taís Araújo para o papel. Imaginem a gafe. Iria reforçar a tese dos aloprados que “a Globo mente”.
Como vimos na época da pandemia, as fake news, ou a mentira pura, pode ocasionar mortes. Um caso chocante envolvendo as mídias sociais foi o linchamento até a morte de Fabiane Maria de Jesus, de 33 anos, no Guarujá. Até hoje não se sabe quem começou o boato, que se espalhou na internet, e dizia que ela era adepta ao satanismo e sequestrava crianças para esses rituais. Tudo mentira.
Tem casos menores, e até mais cômicos, que viraram memes, mas não vamos falar aqui para não dar ideias a pessoas que adoram enganar gente de cabeça fraca.
Muitos veículos de comunicação — os principais jornais, revistas e portais — costumavam pregar peças nos leitores neste dia. Mas já não estão fazendo isso porque, por pior que seja uma mentira, terá alguém que acreditará e causará um dado em si, em outras pessoas, ou, no mínimo ficará mais desinformada e apta a acreditar em outras mentiras. Aliás, esperei para publicar esse texto agora, no sábado a tarde, e não ontem, sexta-feira, ou hoje de manhã, para checar se algum veículo de comunicação iria fazer uma brincadeira, que julgo de mal gosto. Felizmente, não aconteceu, apenas textos menores sobre a data.
Tudo o que escrevi aqui é verdade. Podem checar. Hoje, será o Dia da Verdade.
Esta matéria faz parte das homenagens ao Dia do Jornalista (7 de abril) é um oferecimento de: