Muitas empresas recorrem ao fit cultural como parâmetro na hora da entrevista de emprego. Esse conceito para avaliar candidatos a vagas empregatícias surgiu na década de 1980 e determina que o impacto cultural dos futuros colaboradores na organização. Quanto maior a aderência a valores da empresa, maior a chance do candidato ser aprovado nas seletivas. A técnica é usada para mapear a relação entre as crenças do candidato e da empresa em relação ao ambiente de trabalho. No entanto, segundo especialistas, a prática pode levar a um ambiente homogêneo, sem diversidade, deixando as empresas padronizadas, sem olhar para a inclusão.
Segundo o artigo 93 da Lei nº 8.213/91, empresas com 100 ou mais funcionários estão obrigadas a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com beneficiários reabilitados, ou pessoas portadoras de deficiência.
Porém, a realidade tem se mostrado diferente dentro das companhias. De acordo com a pesquisa Tendências de Gestão de Pessoas 2022, realizadas pela consultoria global GPTW (Great Place to Work), que ouviu 2.653 cargos de alta lideranças e profissionais da área de Recursos Humanos, apenas 17,9% dos entrevistados, tinham a diversidade e inclusão como aspecto prioritário dentro das companhias. O relatório aponta ainda que 12% dos entrevistados afirmaram que a empresa tem maturidade para adotar uma área para a diversidade.
Paralelo às leis, a Organização das Nações Unidas lançou, em 2015, a Agenda 2030 em que elaborou 17 propostas para acabar com a desigualdade nos países, com foco na sustentabilidade e também na diversidade do mercado de trabalho, visto que mesmo com leis, algumas empresas ainda possuem taxas pequenas de diversidade e inclusão em seu quadro de funcionários.
A problemática foi tema do painel “Valores em dia” do 2º Fórum Melhor RH Diversidade e Inclusão, promovido pelo Cecom – Centro de Estudos da Comunicação e Plataformas Melhor RH e Negócios da Comunicação, no início de novembro. Especialistas trouxeram suas experiências na reconstrução das políticas internas orientadas pela diversidade e inclusão, a importância de rever práticas, entender e estabelecer a diversidade como um valor e de como na prática conseguir decisões melhores com base em diferentes perspectivas. Participaram do painel Juliana Aquino, head Projetos de RH da Enel; Paola Klee, diretora executiva de Pessoas do G17- Grupo Todos Empreendimentos, e Pedro Ivo Campos, supervisor KAM da Infojobs.
Fit cultural padroniza, pode não incluir
Para os speakers, a padronização nas empresas alavancada muitas vezes pelo fit cultural na hora das seletivas, diminui a diversidade no momento de definir os selecionados. Juliana Aquino aponta que durante muitos anos grandes companhias, utilizaram a prática a fim de trazer novos talentos, mas tem sido revista por muitas companhias. “Durante anos nós fomos chamados para apoiar as empresas na questão do fit cultural, através de instrumentos. Desde 2019 vemos mudanças, ou seja, o quanto o talento se encaixa na cultura, agora as empresas pensam de formas mais inclusivas”.
A head de projetos afirma que a prática exclui a diversidade nas empresas, cuja mudança seria o resultado das estratégias de diversidade e inclusão. Para ela, a evolução serve também para lidar com um mundo que se transforma em rápida velocidade. As companhias precisam de pluralidade e experiências das mais diversas para ter inovação. “Muito se fala em fit cultural, maior relação da cultura. Mas, a cultura da empresa já é orientada por um padrão. Hoje está tudo muito padronizado, esse foco acaba por excluir a diversidade”, aponta Juliana.
Da mesma opinião compartilha Pedro Ivo. Para o especialista, as companhias não devem trazer práticas que buscam padronizar, mas atrair diversidade ao ambiente corporativo. “Quando padronizamos algo, por mais que tenha um humano ali, acabamos robotizados, precisamos perceber que cada um precisa de um olhar diferente”
Agenda 2030 são princípios norteadores das companhias
A respeito da Agenda 2030 da ONU, Juliana aponta que os princípios são norteadores para as gestões das empresas, que precisam estar atualizadas diante das mudanças “porque será necessário trazermos inovação para a forma como gerenciamos os programas de diversidade e inclusão nas organizações”.
Para Juliana, é imprescindível para as empresas terem pontos norteadores visando 2030. A executiva, que atua desde 2019 em comitês de inclusão, os programas de diversidade são pontos necessários nas companhias, porque é por eles que as lideranças irão se nortear no futuro. “Visando 2030, vai surgir situações inesperadas, onde não vamos ter referência nem interna – em nossas políticas — e nem externa. Neste momento é fundamental termos princípios norteadores”.
Porém, nem todas as empresas têm comitês de diversidade ou estão engajadas no tema. Pedro Ivo salienta que, por mais que seja uma demanda global, cada grupo está em degraus diferentes em políticas inclusivas para seus funcionários, para ele, a iniciativa precisa ser iniciada pelas lideranças e pela área de gestão. “Eu entendo que é um movimento que se inicia. Muitas empresas querem a diversidade de gênero, mas não tem nem a estrutura necessária para acomodar. Cada organização está num grau diferente de evolução”, aponta o supervisor.
Diversidade começa no RH das empresas
Os speakers afirmam também que a área de Recursos Humanos tem papel fundamental na inclusão dentro das empresas. A área é fundamental para o bom desenvolvimento da consciência e da aceitação das diversidades no ambiente corporativo. “É preciso trazer para dentro do RH quais são os temas e as dores para encaminhar os assuntos de diversidade e inclusão dentro da empresa”, afirma Paola.
Nas empresas, os Recursos Humanos caminham lado a lado com a diversidade e em muitas companhias é proporciona a porta de entrada das minorias. Os speakers ressaltam que a área, junto com os líderes, é responsável por criar ações que deem oportunidades e muitas sejam a porta de entrada de minorias. Paola destaca as ações e os comitês de inclusão como um primeiro passo para o ingresso da diversidade. “As empresas precisam criar processos e objetivos claros, fazer com que a governança se relacione com esses grupos. Além da diversidade, temos diversos tipos que precisam da escuta, e de pessoas que estão acima se conectem com quem está levantando as bandeiras”, lembra Paola.
Porém, a executiva afirma que, em muitas companhias, ainda é difícil os projetos de inclusão saírem do papel para serem colocados em prática. Klee afirma que é preciso traduzir em ações concretas “para não ficar muito distante da realidade” e com isso criar oportunidades. Juliana completa afirmando: “Todas as áreas precisam se conectar com a área de diversidade e inclusão, e isso precisa ser o objetivo da empresa ser o lugar modificador”.
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