Diversificar receita é o caminho para superar dificuldades no financiamento do jornalismo

Investir em veículos jornalísticos é estratégico para os negócios e contribui para a defesa da democracia

Produzir jornalismo de qualidade custa caro e com a crise no modelo de negócio das mídias tradicionais e a queda das receitas publicitárias, veículos vêm enfrentando problemas de financiamento.

Com recursos insuficientes para a manutenção adequada do trabalho jornalístico, grandes empresas consolidadas tiveram que encerrar parte das suas operações ou fecharam totalmente as portas nos últimos anos, como foi o caso do El Pais Brasil.

O peso da democracia

O fechamento de mídias jornalísticas traz prejuízos à sociedade como um todo, já que uma das razões de existir da imprensa é funcionar como “cão de guarda” fiscalizando os poderes políticos e econômicos do país.

“Sem a imprensa não há democracia. As empresas muitas vezes se esquecem disso. Pode ser que tenham a ilusão de que poderiam prosperar em regimes menos democráticos ou até mesmo não democráticos, mas essa é uma armadilha fatal. Sem a democracia não se assegura um sistema de livre iniciativa e de competição leal no mercado”, afirma Eugênio Bucci, professor titular da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da USP.

“Financiar o jornalismo é um investimento estratégico para os negócios, pois o ingrediente da democracia é insubstituível. Além disso, as empresas também podem apoiar o jornalismo profissional com a finalidade de conseguir uma exposição favorável perante o público comprando espaços de veiculação publicitária”, complementa.

Segundo Carlos Eduardo Lins da Silva, professor e coordenador do Centro Celso Pinto – Insper, os negócios tendem a prosperar em sociedades democráticas e livres.

“Sem um jornalismo forte e independente, as chances de disseminação de informações falsas aumentam. Consumidores, acionistas e funcionários usufruem de melhores condições quando todos recebem informações confiáveis e corretas”, explica.

Investir em veículos jornalísticos é estratégico para os negócios e contribui com atividade essencial para a democracia (Foto: Pìxabay)

Auxiliar na obtenção de recursos e construir uma relação próxima com os veículos são alguns dos compromissos da Vivo, de acordo com Elisa Meirelles de Miranda Prado, diretora de Comunicação Corporativa. Segundo ela, é importante que o apoio à mídia seja constante.

Nós apoiamos por meio do relacionamento comercial, com a realização de patrocínios e anúncios. Nosso apoio neste sentido se dá por meio da análise de projetos que tenham aderência à nossa estratégia. Outra importante forma de apoio – e que considero parte fundamental do nosso trabalho – é a construção de uma relação próxima e transparente com jornalistas e veículos”, destaca. Desde 2017, a Vivo disponibiliza aos seus assinantes acesso ao GoRead, plataforma de revistas digitais do grupo Abri que conta com mais de cem publicações.

Leandro Modé, superintendente de Comunicação Corporativa do Itaú Unibanco ressalta os protocolos e metodologias que o jornalismo profissional segue para garantir qualidade na informação como um dos aspectos que incentiva o apoio financeiro.

“O trabalho dos jornalistas profissionais é o que mais se aproxima da verdade, por envolver a apuração e o relato fidedigno dos fatos, garantindo sua melhor descrição. Sendo assim, mantemos uma agenda de anúncios publicitários em diferentes veículos, publicamos branded contents e, com a Editora Globo, lançamos no fim de 2021 a plataforma Inteligência Financeira (que faz uma ampla cobertura de finanças e investimentos) em diferentes formatos”.

Pedras no caminho

O modelo tradicional da indústria do jornalismo baseado na venda de anúncios e de exemplares foi abalado com o advento da internet. Mesmo com a confiança do público, empresas jornalísticas efetuaram cortes de pessoal e de custos e em dois anos três versões brasileiras de grandes veículos deixaram o país: El País Brasil, BuzzFeed News e Huffpost (antigo Huffington Post).

“Essas plataformas tecnológicas passaram a fornecer ao público sem custo monetário o conteúdo produzido pelos veículos jornalísticos e sem remunerá-los. Anunciantes passaram a divulgar seus produtos e serviços por meio das plataformas, que são capazes de focar em grupos demográficos específicos para essa veiculação com custos bem menores”, explica Silva.

A falta de publicidade devido ao protagonismo das plataformas virtuais tem prejudicado bastante a maioria dos veículos jornalísticos. “As três maiores plataformas (Google, Amazon e Meta-Facebook) receberam 47% de toda a verba publicitária do mundo em 2021. Além disso, os anunciantes também têm investido em outras formas de publicidade, como a feita em pontos de venda”, destaca o coordenador do Centro Celso Pinto – Insper.

Apesar de grande parte da verba estar direcionada as plataformas digitais, a parcela de empresários que escolhem investir no jornalismo profissional recebe um ganho a curto e médio prazo, o que acaba sendo mais interessante para a reputação da companhia no meio social.

“Um empresário que investe em jornalismo possui incontáveis ganhos em relação ao público. O jornalismo é sim uma comunicação minoritária entre as redes, entretanto, a qualidade do retorno desse tipo de comunicação é muito mais sólida do que a agitação efêmera e fugaz das plataformas digitais”, afirma Bucci.

Caminhos alternativos

Apesar de sua pulverização e forte migração para as grandes plataformas digitais, a obtenção de verbas pela publicidade ainda é um modelo muito utilizado, pois traz benefícios tanto para as empresas quanto para os veículos jornalísticos.

Atualmente, entretanto, as organizações de jornalismo examinam outras soluções para contornar essa crise de modelo de negócio, pois apenas a receita publicitária não é suficiente para manter suas operações.

“Uma das alternativas de financiamento mais interessantes está sendo realizada agora na revista Piauí. Trata-se do Endowment, em que se estabelece um fundo patrimonial (neste caso no valor de R$350 milhões). O valor anual para a revista deverá ficar na faixa de R$10 milhões ou R$12 milhões a partir dos rendimentos, não do principal, visando manter intacto o fundo. Esquema semelhante a este tem sido usado com sucesso desde 1936 no jornal britânico The Guardian”, diz Silva.

Modelos alternativos ajudam a fornecer suporte, portanto, alternativas como os subsídios públicos e a taxação de plataformas tecnológicas são tratados como caminhos para garantir a sobrevivência do jornalismo.

“Existe o receio de que o uso de dinheiro público possa comprometer a independência dos veículos, embora haja propostas de se estabelecerem modos de impedir a interferência de governos no conteúdo. Alguns países também estão discutindo leis para que parte dos lucros das plataformas de redes sociais seja direcionada compulsoriamente para veículos jornalísticos independentes”, conclui.

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