Você tem sido considerada “Midas” do mercado, com diversos best-sellers. O que confere o olho clínico para identificar sucessos?
Mais que olhar apenas para o livro e para sua qualidade intrínseca – o que é, claro, fundamental, e o primeiro passo para o sucesso – é preciso olhar para o leitor. É necessário entender como são e como se comportam os leitores de cada segmento ou gênero. É preciso observar as tendências de comportamento, como está a cabeça das pessoas, suas crenças, vontades, interesses. Tudo isso determina o que as pessoas buscarão para ler, mesmo inconscientemente.
É por isso que, muitas vezes, um grande sucesso estrangeiro não tem o mesmo desempenho no Brasil – as realidades e as pessoas são diferentes. De modo simplificado, o best-seller acontece quando você encontra um livro bom o suficiente (para o leitor), que atenda a um grande número de pessoas em alguns dos seus anseios em comum, a ponto de fazê-las comprar (e ler!). No entanto, no mundo dos livros nada é garantido. Não existe fórmula mágica para best-sellers e surpresas acontecem o tempo todo, para o bem e para o mal. É preciso treinar o olhar e aguçar a sensibilidade.
Um dos diferenciais são os talentos estreantes. Há mais ferramentas para encontrá-los ou estamos diante de uma nova geração de escritores?
Podemos dizer que ambos os fatores existem. Os jovens desta geração comprovadamente leem mais – tanto nos livros quanto na web -, e também escrevem mais, expressam-se mais. E a internet, com as redes sociais, os blogs e os sites de autopublicação, ou a própria Amazon, permitem que as pessoas escrevam suas criações.
Dessa maneira, elas podem testar seu conteúdo de forma fácil, gratuita e experimental, podendo ter um grande feedback do seu trabalho de maneira quase instantânea. E se essa pessoa consegue atrair um grande número de leitores e até fãs, ela já está se provando como um bom produtor de conteúdo para determinado tipo de audiência. Ou seja, no passado, para conquistar leitores, um autor precisava ser publicado.
Hoje, para um estreante ser publicado, é desejável que ele já tenha leitores ou interessados em seu trabalho. Mas é claro que isso não é uma regra. Há logicamente quem não publique nada na internet mas tenha um grande potencial como autor, com seus originais escritos de maneira convencional, e quando nos deparamos com alguém assim, o consideramos fortemente, claro.
Um case interessante é a trilogia que surgiu a partir de uma página do Facebook, as Indiretas do Bem. Como isso foi construído?
As autoras do Indiretas do Bem tinham várias características interessantes: uma mensagem absolutamente positiva que embasava seu trabalho; conteúdo criativo produzido por elas também em termos gráficos (desenho inclusive);uma comunidade que tinha um número espantoso de seguidores no Facebook (5 milhões na época) e também nas suas outras redes sociais, e que tinha crescido de forma espontânea e orgânica, com um engajamento muito alto e com um poder viralizante enorme, além de uma audiência principalmente de jovens.
Na época que contratei o projeto, estava despontando a tendência de livros interativos, com grande interesse dos jovens pelo livro-objeto. Mas todos os que existiam no mercado eram estrangeiros, e com mensagens mais “destrutivas” ou então apenas de atividades gráficas, mais como um passatempo.
Então, pensei: por que não um livro nacional, conectado com nosso público, e com uma mensagem positiva, “do bem”, “coisas para deixar seu dia mais feliz”, que é a essência das autoras e de seu trabalho, com a “cara” das Indiretas do Bem? Me pareceu a adaptação perfeita da essência de um conteúdo de web para um livro físico, e para aquele momento específico. Deu certo.
Qual a importância dos influenciadores digitais nesse momento do mercado editorial?
Os influenciadores, sejam digitais ou não, são e sempre foram fundamentais para o mercado editorial. Com tantos lançamentos de livros por mês, na verdade em um número bem maior que o varejo consegue absorver (estima-se quem sejam publicados em torno de dois mil novos títulos mensalmente), o grande desafio para um livro é conseguir ser descoberto por seu futuro leitor para ser comprado, em meio a tantos outros.
Os potenciais interessados precisam saber que um livro existe, seja por ele estar bem exposto em uma livraria, seja porque ele foi divulgado de todas as maneiras possíveis, dentro de um orçamento viável para uma editora, que em geral é sempre limitado. Portanto, influenciadores fazem a diferença para o desempenho de um título, porque estão com determinada audiência ou segmento ao alcance de sua mão.
Um exemplo de influenciador digital são os blogueiros literários e os booktubers, que são seguidos por pessoas em busca de sugestões de leitura. Eles fazem resenhas de livros que compraram ou que receberam como cortesia de editoras, e uma boa avaliação dos que têm mais seguidores ou melhor reputação realmente pode fazer com que os livros indicados decolem. Outro tipo de influenciador são profissionais ou professores que indicam títulos sobre carreira ou negócio e eles passam a ser adotados, ou até atores ou celebridades que são vistos lendo determinado livro, que acaba sendo procurado por seus fãs também.
Quanto a participação do público infanto-juvenil nos negócios das editoras?
Hoje, não só no Brasil, mas no mundo todo, o segmento infanto-juvenil é o que mais cresce e mais figura nos primeiros lugares das listas dos mais vendidos. A grande massa de leitores de livros comerciais – os que têm vocação para vendas substanciais – hoje mesmo parece ser jovem, e essa geração vive os mundos online e offline da mesma maneira, ou seja, não há diferenciação para o jovem entre o que acontece na internet e fora dela. É tudo uma coisa só. O jovem gosta do crossmedia, ou seja, de consumir seu conteúdo preferido em vários meios diferentes: livro, filme, game, internet, brinquedo, aplicativo de celular, parque temático, roupa, enfeite…
Para ele, é como se pudesse vivenciar mais daquele mundo incrível criado pelo autor e definir sua própria identidade ou sua tribo. Por isso, não é de se espantar que hoje vemos livros best-sellers de youtubers, de games como Minecraft, de filmes como Star Wars, de séries, de contos de fadas que já virama filmes etc. Além disso, nas redes sociais, os leitores jovens podem conhecer os autores dos livros e interagir com eles, que se tornam quase como personagens, ídolos, algo típico dessa fase da vida.
Best-sellers, como Harry Potter, formaram uma geração de leitores. De que maneira isso reflete nas preferências editoriais do mercado?
De fato, Harry Potter formou toda uma geração de leitores. Quem leu HP quando ele foi publicado no Brasil descobriu o prazer de de ler quando era criança ou iniciava a adolescência, e se apaixonou por livros.
São pessoas que foram infectadas pelo vírus da leitura e nunca mais se curarão, felizmente! Elas começaram a ler fantasia, buscaram outros títulos similares, depois misturaram fantasia com romantismo, leram distopias, alguns preferiram livros mais contemporâneos, sobre o mundo real e seus problemas difíceis e por aí seguiram.
Uma pequena parcela dessa geração deu um passo a mais e mergulhou na literatura mais sofisticada, foi ler clássicos, obras consagradas, não comerciais. Claro, isso é natural, não são todos os que têm essa preferência, e ninguém é obrigado a isso. Ler tem de ser um prazer sempre.
Mas o bom é que as novas gerações que vieram depois de HP continuam lendo, e já têm à disposição um acervo imenso de publicações de diversos gêneros, além dos lançamentos e novidades. Por outro lado, livros profissionais, de carreira e aperfeiçoamento pessoal também são procurados, pois essa geração hoje está entrando e se estabelecendo no mercado de trabalho, e tem esse interesse.
Com tantas oportunidades online, como o impresso ainda encontra diferenciação?
Existem de fato muitas oportunidades online, e muitas publicações têm mesmo vocação para ficar no online, ou até no ebook não impresso, como os volumosos e custosos Vade Mecum jurídicos. Porém, ser publicado no impresso por uma editora convencional, consagrada, que vai oferecer total apoio ao autor, desde o trabalho de edição de texto, para que o resultado seja o melhor possível, do projeto gráfico, de um título e capa profissionais e vencedores, até a ampla distribuição comercial, o investimento de marketing, de divulgação, de comunicação, de assessoria de imprensa, de reimpressão ágeis, enfim, de tudo o que o livro precisa para ser um sucesso, ainda é uma chancela de curadoria, de diferenciação, de aposta, de escolha entre tantos outros projetos que estão diluídos no mar do online, imersos ao lado de coisas igualmente boas e péssimas, pois nem sempre existe um olhar criterioso de quem navega por aí para diferenciar o joio do trigo.
Falando ainda em online e impresso, parece contraditório, mas as novas gerações preferem ler livros impressos e não ebooks pu pdfs. As pesquisas mais recentes mostram isso.
Além da relação com o livro impresso, o livro-objeto, que dá uma experiência sensorial de tato, olfato, audição e até paladar, que um livro eletrônico ou uma publicação online nunca daria, criar uma biblioteca em casa, ou uma estante de livros, é algo que todo mundo tem orgulho de fazer. E saber que se leu todos eles é algo que ninguém tira de você. Ser publicado, então, e ver seu nome nessa estante, é o sonho de muita gente.